Fotos – Ademar Amaral
por Ademar Ayres do Amaral (*)
Após um pesadelo nada agradável, acordei um tanto ansioso, às quatro da manhã, naquele dia 21 de fevereiro de 2009.
Meus sonhos até que são muito tranquilos e quase sempre envolvem acontecimentos triviais que se passaram ainda na minha infância, no Paraná da Dona Rosa. Raramente tenho pesadelos, mas aquele me fez acordar com suor frio e taquicardia.
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O cenário era a Av. Nazaré e eu saía do prédio onde até 28 de abril passado morou minha saudosa mãe, quando alguns bandidos me abordaram e, um deles, portanto uma metralhadora, disse: “este aqui já vai”. E deu uma rajada certeira quase encostando o cano da arma na minha barriga.
Sem sentir dor, mas consciente de que estava gravemente ferido, saí em desabalada carreira no rumo da Praça da República em busca de encontrar um táxi para me levar a algum hospital. Abordei vários deles e todos se recusavam a me dar socorro.
Então, desesperado, decidi ir até ao Hotel Hilton, varando por detrás do Teatro da Paz, mas no hotel também não havia táxi e quando consegui chegar à recepção para convencer alguém a me chamar um, acordei espantado e não dormi mais.
De manhã, deixei o pesadelo de lado e saí cedo pra batalha de todos os dias sem contar à minha esposa. Ao chegar na empresa, não gostei nada de ver jogado no chão a pequena imagem do Santo Antônio que minha mãe tinha me dado de presente há muitos anos.
Deu um pressentimento esquisito que o dia seria daqueles, mas tratei de ultimar os detalhes da viagem a serviço que eu e um grupo faríamos no fim da tarde para Porto Trombetas.
Um dos que iam conosco era meu amigo Sodré, engenheiro boa praça que trabalha na empresa há mais de trinta anos. Pois nem bem ele entra no escritório e nos dá bom dia, foi logo contando que tinha acordado à noite depois de um terrível pesadelo.
No dele, nós estávamos com nossas famílias na Assembléia Paraense, quando o clube foi invadido por bandidos e ele acordou na hora que um grupo de pessoas tentava me reanimar depois que um dos bandidos me agrediu.
Levar uma rajada de metralhadora e ser agredido em dois pesadelos diferentes numa mesma noite, me pareceu no mínimo estranho. Bati três vezes na madeira e continuei com meus afazeres.
Às 17:30, quatro da empresa e mais um australiano decolamos de Belém pela Trip Linhas Aéreas, num turboélice de asa alta, o ATR-72, com destino a Porto Trombetas, fazendo escalas em Altamira e Santarém.
Projetado para 68 passageiros, o ATR-72 é considerado um dos aviões mais modernos da indústria aeronáutica para vôos regionais tipo pinga-pinga como seria o nosso. A aeronave deixou Val de Cães com 47 pessoas a bordo, e nossa primeira escala, em Altamira, seria às 18:20.
Como é meu costume quando viajo de avião, e praticamente viajo neles quase toda semana, sempre que possível escolho um assento no corredor que seja próximo a uma das janelas de emergência. Nesse vôo eu estava à direita, na segunda poltrona do corredor e bem próximo à saída de emergência.
Faço questão do assento no corredor para facilitar alguma ida ao toalete sem perturbar o vizinho e para ganhar tempo na hora da chegada. A proximidade da porta de emergência é meramente uma questão de segurança, mesmo o avião sendo um dos meios de transporte mais seguros do planeta.
O bicho só perde para o elevador, mas nunca se sabe como está o santo de cada passageiro, e parece que naquele 21 de fevereiro de 2009, a exatos dois meses do meu aniversário, o santo que não estava de mau humor era o meu.
O avião fez a aproximação normal de Altamira e os comissários nos informaram de todos os procedimentos.
Tudo rotina e correndo às mil maravilhas num céu quase de brigadeiro. O ATR-72 toca na pista sem nada de anormal e a gente ouviu o deslizar característico das rodas no asfalto. Em Altamira, sempre com um pouco mais de incômodo porque dá sempre a impressão que a pista anda precisando urgente de uma melhor recapagem.
Mas depois de rodar uns 50 metros e ainda em grande velocidade, ouviu-se um estalo assustador, produto da quebra do trem de pouso do lado esquerdo. Imediatamente a asa do mesmo lado bateu violentamente na pista e teve a ponta quebrada.
As pás da hélice também foram se desintegrando com o impacto na pista e soltando estilhaços perigosos com risco de algum furar o tanque da asa e fazer o avião explodir. Enquanto isso, e numa fração de segundos, o avião continuou deslizando sem controle ao longo da pista.
O pavor aumentou quando a fumaça invadiu o ambiente da fuselagem através do sistema de ar condicionado devido a um princípio de incêndio no motor esquerdo. Quase no final da pista o avião dobrou abruptamente num ângulo de quase 90 graus à esquerda e parou pouco antes de bater no mato.
As portas de emergência foram abertas e eu, por estar perto de uma delas, fui o segundo passageiro a pular depois de ajudar um pai com uma garotinha e de lançar minha mochila pra fora.
Já afastado uns vinte metros, lembrei de registrar aquele momento e fiz dois pequenos filmes, dando ainda tempo de mostrar os passageiros saindo. Só nesse momento percebi que tinha sangue na mão por ter sofrido um corte num dos dedos, ao escorar na porta de emergência para amortecer minha queda.
Passado o aperreio, fomos todos caminhando até a sede do aeroporto, exceção de um único passageiro que teve um corte sem gravidade no rosto e foi levado por uma ambulância.
Ainda na pista, liguei logo pra minha família para tranquilizá-los antes que a notícia desse na televisão. E ao entrarmos na sede do aeroporto já encontramos todas as emissoras de televisão à cata de algum registro para reportagem.
Eu e meus amigos fomos aguardar nossas bagagens no bar e estávamos bebemorando umas cervejas para celebrar nossas vidas, quando apareceu uma repórter da Record News e me chamou:
-Falaram pra mim que o senhor fez um filme.
-Fiz, tá aqui comigo, vou levar pros meus filhos.
Pronto, quando olhei em volta estava cercado por um monte de repórteres e filmadoras. Acabei passando a cópia do filme para todos eles que, não conformados, resolveram também me entrevistar.
Meu tremido filme foi o que saiu em todas as emissoras do Brasil naquela noite. E por causa da entrevista recebi ligações de diversos amigos que eu nunca julguei ter por esse Brasil afora.
Sete anos já se passaram, mas sempre que me encontro em um avião e a aeromoça anuncia aqueles procedimentos de pouso, vem à lembrança aqueles momentos terríveis do acidente de Altamira.
Segundo o comandante, com quem conversei depois do susto, houve sério risco de explosão e por pouco não levamos farelo, mas Deus deve ter visto alguma coisa boa no meu cadastro e me concedeu mais um tempinho aqui antes de eu ir embora de vez.
Minha mãe faleceu dia 28 de abril passado, o santinho que ela me deu continua comigo e, por recomendação dela, desde aquele dia passou a ser também meu companheiro de todas as viagens.
PS – As duas fotos sãoo avião depois do acidente.
Prezado amigo Amaral! Folheando os meus guardados, encontrei um cartão que, no Natal de 1997, nos foi carinhosamente endereçado por vocês, Amaral e Rosa. Embora tivéssemos convivido por um breve período, em 96, numa excursão a países da Europa, guardamos na lembrança os bons momentos que desfrutamos na companhia de vocês.
Buscando notícias sua no computador, encontrei esta, ocorrida em 2009. Compartilhamos da mesma alegria de todos aqueles que, como nós, o temos por amigo. Graças a Deus, tudo não passou de um susto. Deus os
abençoe e que Santo Antônio sempre os proteja. Jorge Aguiar e Clara.
Belo texto
Obrigado Altair. Sorte é boa de qualquer jeito. E que venha sempre.
Senhor Jeso, no meu comentário errei ao escrever “Boa sorte”. Por isso, gostaria, caso o meu comentário for aprovado, que o sr. publique este abaixo, já retificado. Obrigado
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Um amigo meu diz que não existe sorte nem azar. Mas prefiro acreditar que exista. Por isso, continue sempre com essa grande luz a iluminar o seu caminho. Sorte sempre, sr. Ademar.
Um amigo meu diz que não existe sorte nem azar. Mas prefiro acreditar que exista. Por isso, continue sempre com essa grande luz a iluminar o seu caminho. Boa sorte sempre, sr. Ademar.