por Evaldo Viana (*)
Sim, contemplar e, num certo sentido, se regozijar das, digamos, muitas e inacreditáveis realizações, transformações e revoluções à frente da prefeitura que haviam se operado sob o seu comando em apenas um único ano.
Ao assumir o mandato, o prefeito sabia das muitas dificuldades que o aguardavam e que contava com o apoio de expressiva parcela da população santarena para implementar todas as medidas administrativas necessárias para que, enfim, o município pudesse dar o grande salto para a frente há muito esperado.
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A classe política tradicional, que nunca reclamava de absolutamente nada porque sempre, governo após governo, dava um jeitinho de tirar o máximo de proveito da máquina pública, acreditava que, afora alguns arroubos de início de governo, tudo ficaria como sempre foi, ou seja, a prefeitura seria engendrada, aperfeiçoada e formatada para servir aos políticos amigos e apoiadores do prefeito.
Mas acontece que no alvorecer do dia primeiro de janeiro do ano do grande sono o prefeito convocou uma reunião com todos os vereadores eleitos e disse aos presentes (dois vereadores da oposição não compareceram) o que, em linhas gerais, pode-se resumir assim:
“Fui eleito pelo nosso povo para cumprir um mandato de quatro anos e digo com toda a sinceridade que não tenho nenhum interesse na reeleição. Isso significa dizer que qualquer dos presentes, se fizer por onde, pode seu meu sucessor.”
“ Para honrar o compromisso de campanha e viabilizar a aprovação do projeto de lei que pretendo encaminhar ao legislativo, preciso contar com apoio de pelo menos onze vereadores. Não quero apoio incondicional, mas preciso do comprometimento dos que sairão desta reunião como vereadores da situação. Rogo que os demais facão oposição honesta ao meu governo, que respeitará e até expressará agradecimento aos opositores honestos e responsáveis.”
“Creio que todos os aqui presentes, representantes eleitos pelo povo, sabem da situação em que se encontra o nosso município e que será preciso um gigantesco esforço da nossa parte para realizarmos as transformações, inclusive no campo dos costumes políticos, necessárias para a promoção do progresso, desenvolvimento e bem estar da população santarena.”
“É pensando no bem comum, nas necessidades do nosso povo e no futuro de nosso município que comunico aos senhores minha decisão de realizar o governo mais austero que o município já teve e, em razão disso, medidas de contenção de despesas e racionalização da máquina administrativa serão adotadas imediatamente”.
“A estrutura administrativa da prefeitura terá apenas oito secretarias, os servidores temporários serão reduzidos pela metade, sem prejuízo da educação e saúde, que terão o número de servidores necessários para atender, de modo satisfatório, à população.”
Todos os secretários serão indicados pelo Prefeito. No meu mandato, vereador não nomeia secretário e não indica apaninguado para cargo ou função pública”.
“Até junho desse ano o município realizará concurso público para a substituição definitiva de todos os servidores temporários. Ao final do meu mandato, não haverá nenhum servidor que não seja concursado”
De início, a grita foi geral, mas os vereadores perceberam que o prefeito estava possuído de inabalável convicção e que não conseguiriam demove-lo das suas inesperadas posições.
O prefeito convencera-se de que o insucesso dos governos anteriores devia-se menos à limitação das receitas do que à corrupção, o desperdício e o elevado comprometimento dos recursos da municipalidade com as Despesas Correntes, principalmente com a folha de pagamento do executivo, que atingira em 2012 mais de 63%.
Estava decidido a reduzi-la a 48% e cortar radicalmente as despesas de Custeio consideradas supérfluas e desnecessárias.
Já no primeiro dia do ano do grande sono, o prefeito reuniu o seu secretariado e disse em tom enérgico que nenhuma despesa supérflua ou inútil seria tolerada. Anunciou algumas medidas simples, mas de profundo valor simbólico.
Anunciou que a partir daquele dia ele dirigiria seu próprio carro e que nenhum secretário estava autorizado a fazer uso de veículo oficial fora do horário de expediente.
Perturbava profundamente o prefeito saber que alguns serviços eram realizados por empresas privadas quando poderiam perfeitamente serem executadas pelo próprio município, através de empresas públicas.
Pensando nisso, logo no início do mandato, decidira criar uma empresa pública para a coleta de lixo e para a realização dos serviços de manutenção e ampliação da rede de iluminação pública.
Se no ano anterior ao início do seu mandato o município gastava mais de R$ 13,00 milhões com a coleta de lixo, através da empresa pública municipal esse serviço, ampliado e aperfeiçoado também com a coleta seletiva, passou a consumir não mais que R$ 7,00 milhões, o que, evidentemente, resultou numa economia aos cofres públicos de R$ 6,00 milhões.
O mesmo se deu com a execução dos serviços de Iluminação pública, para o qual o município, em anos pretéritos, costumava destinar toda a receita proveniente da arrecadação da CIP – em torno de R$ 11,00 milhões – agora, com a realização feita por uma empresa pública municipal, o desembolso anual limitou-se a R$ 5,00 milhões, o que permitiu ao prefeito adotar uma medida inédita, talvez em todo o país:a redução da alíquota da Contribuição de iluminação Pública, visto que a arrecadação desse tributo, por determinação legal, tem de ser aplicada inteira e exclusivamente nesse serviço.
Racionalizadas e controladas as despesas de custeio e da folha de pagamento, a prefeitura estava apta a alocar vultosos recursos para os investimentos nas área de saúde, educação e infraestrutura e foi isso que aconteceu ao longo do ano do grande sono.
O prefeito era conhecedor do caos na saúde pública municipal e sabia da necessidade de corrigir graves distorções na área, principalmente a falta de medicamentos e médicos nos postos de saúde e fazer o prédio do HMS funcionar verdadeiramente como um hospital próprio para atender seres humanos.
O Grande Gestor pediu aos técnicos de informática que desenvolvessem um aplicativo que possibilitasse, não apenas a ele, mas à população em geral saber o quantitativo de todos os remédios em cada unidade de saúde do município, alertando para a queda desses estoques quando chegasse a um percentual crítico, situação em que haveria imediata reposição.
Paralelamente a essa medida, convocou uma reunião com todos os médicos vinculados ao município e anunciou, de pronto, um reajuste linear de 83,98%, mas disse que a partir do primeiro dia útil do 2º mês do ano do grande sono os profissionais de jaleco branco juramentistas de Hipócrates teriam de cumprir, rigorosamente, a carga horária para a qual foram contratados. Não permitiria, jamais, que um médico contratado para trabalhar quatro horas realizasse seu trabalho em apenas 40 ou 50 minutos.
O Hospital municipal, no ano do grande sono, também passou por uma fantástica reVonlução. Se antes era rotina encontrar dezenas e até mesmo centenas de pacientes aguardando por cinco, sete e até mesmo dez horas para serem atendidos por um único médico, agora o tempo médio de espera sequer chegava a 10 minutos, quando muito a 15 ou, no máximo, há 20 minutos.
Qual a mágica? O prefeito descobriu que, antes, embora a prefeitura remunerasse pelo HMS mais de 100 médicos, era prática corriqueira deixar apenas um de plantão prestando atendimento emergencial. O prefeito decidira que não menos de 10 médicos ficariam ininterrupta e diuturnamente no HMS.
Na Educação, operou-se transformações até mais profundas.
Nos primeiros dias do primeiro mês do ano do grande sono, o prefeito convidou o SINPROSAN para uma reunião, inicialmente programada para duas horas, mas que se estendeu pela manhã, à tarde à noite, ocasião em que o Grande gestor expressou sua profunda preocupação com a área educacional e em especial com as condições de trabalho dos professores.
Nessa reunião, o Grande prefeito comprometeu-se, entre outros pontos igualmente relevantes, a climatizar todas as escolas da zona urbana do município até o término do primeiro ano do grande sono; a criar mecanismos efetivos de compensação aos professores pelas atividades desempenhadas extra-classe; e afirmou que em até 30 dias enviaria à Câmara Municipal projeto de Lei dispondo sobre o salário móvel dos professores cujas escolas obtivessem melhores resultados no IDEB.
Os professores, por seu turno, maravilhados e encantados com os gestos do Prefeito, comprometeram-se em empenhar todas as energias para transformar Santarém em município referência na área educacional.
Desnecessário dizer que o Prefeito e professores cumpriram todas as propostas pactuadas.
Mas isso ainda era pouco para o grande gestor. Sabia que podia mais e acreditava que tudo era possível, desde que houvesse Vontade de fazer. E Vontade parecia ser o nome do Prefeito.
Não custa enfatizar que a decisão de cortar fundo o desperdício, combater a corrupção e realizar um governo de extremada austeridade rendeu aos cofres da prefeitura um superávit nunca antes alcançado e, com essa folga de caixa, o Prefeito pode realizar no ano do grande sono investimentos da ordem de R$ 32,0 milhões, apenas na pavimentação de vias públicas.
Inicialmente, optou pela execução direta, mas percebera que não daria conta de pavimentar os 60 Km que planejara apenas para o ano inaugural de seu governo, quer dizer, no ano do sono grande.
Após consultar o secretário de Infraestrutura, ouvir os técnicos da área de Finanças e de Obras, o Prefeito decidiu realizar uma grande licitação com o objetivo de pavimentar 50 Km da malha viária da cidade. Quebraram as fuças quem acreditou que o Prefeito realizaria processo licitatório meia boca, eivado de vícios e abundante em procedimentos fraudulentos.
Do processo licitatório, devido à ampla publicidade do certame, participaram empresas de todas as regiões do país e saiu vencedora a que efetivamente apresentou o menor preço e assegurou a qualidade exigida no edital.
Ouvir os entendidos em determinados assuntos e tomar decisão levando em conta a opinião de especialistas é próprio do Prefeito, mas não quer dizer que suas decisões não possam receber colaborações de outras fontes, como, por exemplo, dos sonhos que costumam ajudar muito o Grande Gestor a guiar-se pelo melhor caminho.
Certa feita sonhara com o Capitão Nascimento advertindo-o para a ridicularia a que seria exposto se a prefeitura construísse em logradouros públicos árvores natalinas pneumáticas.
No dia seguinte ao sonho o Prefeito lembrara-se da frase dita pelo encolerizado Capitão Nascimento:
“Poda, o Secretário das árvores pneumáticas.”
O prefeito ainda matutava sobre a frase enigmática quando adentrou o seu gabinete um secretário eufórico, anunciando que tivera uma grande e brilhante ideia para o natal. Falou entusiasticamente em construir árvores de pneus e, nesse exato momento, foi podado definitivamente do secretariado.
Noutro sonho, Nelson Mandela o aconselhava a dar mais atenção aos idosos e fazer um governo voltado também para esse segmento da população. Como estava próximo das festas natalinas, o Prefeito decidiu fazer uma grande homenagem à terceira idade. Convocou seus colaboradores e amigos mais próximos e, em carreata, dirigiram-se ao Asilo Vicente de Paula onde convidou os velhinhos a dar uma volta pela orla e pontos turísticos da cidade.
Ninguém nunca tinha visto na igual. O prefeito, passeando com os velhinhos em seu próprio carro! Isso é inacreditável! É o Prefeito dos nossos sonhos! Exclamavam os transeuntes, boquiabertos com inacreditável cena.
Ao final do ano, é claro que a popularidade do prefeito estava nas alturas e tornara-se inclusive um dos prefeitos mais bem avaliados no Estado e no País. O governador, frequentemente o convidava para participar de eventos na capital a fim de posar ao lado do Grande Prefeito e, evidente, tirar algum proveito político.
Bom?! Não. Ele é muito Bom! Diziam até os blogueiros do contra e um certo articulista de quinta categoria, especialista em atormentar e fustigar com números e planilhas que, frequentemente, discrepavam da realidade sonhada nos grandes e profundos sonos dos gestores santarenos.
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* É servidor público federal e articulista do blog e do TV Blog do Jeso.