por David Marinho (*)
O crescimento urbano modifica a cobertura vegetal e provoca efeitos na dinâmica do ciclo hidrológico natural. A urbanização altera a cobertura da bacia com pavimentações impermeáveis, que exigem condutos para o escoamento pluvial, alterando o ciclo natural.
Quando se reduz a infiltração no solo, essa água soma-se ao escoamento superficial, e seu esgotamento por meio de condutos reduz o tempo de deslocamento pela velocidade de escoamento, aumentando as vazões e antecipando seu pico no tempo, com alagamentos caóticos nos cruzamentos de algumas ruas da cidade.
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Com pouca infiltração, se reduz o nível do lençol freático por falta da recarga hídrica, reduzindo o escoamento subterrâneo. A substituição da cobertura natural por elementos impermeáveis reduz a evapotranspiração da vegetação e do solo. E a superfície urbana não retendo água como a cobertura vegetal, elementos antrópicos são inseridos na bacia hidrográfica e no sistema climático que passam a atuar sobre o meio ambiente local, como:
Aumento da temperatura: as superfícies impermeáveis como concreto e asfalto absorvem e retém a energia solar, aumentam a temperatura ambiente, criando “ilhas de calor” no centro urbano. E esta absorção solar reflete radiação térmica para o ambiente, gerando calor, e esse aumento da temperatura cria condições de movimento de ar ascendente, aumentando as precipitações (chuvas).
Sedimentos sólidos: no crescimento urbano, a produção de sedimentos é carreada para o assoreamento da bacia hidrográfica, devido às construções, limpeza de terrenos para loteamentos, construção de ruas e rodovias entre outras causas.
As administrações públicas asfaltam vias urbanas sem construírem sua drenagem profunda com galerias e bocas-de-lobo, que suportem a demanda cada vez maior da contribuição pluviométrica da região. Essas obras subterrâneas por não impressionar o eleitor, não são feitas, mas são necessárias.
Um exemplo disso é o recapeamento da avenida Borges Leal, que provocará escoamento superficial sem controle, num grande trecho em declive da avenida Magalhães Barata até a orla do Mapiri, que certamente danificará o asfalto aplicado, e inundará residências. Um verdadeiro rio urbano…
É imprescindível executar urgente uma malha estratégica de galerias pluviais coletoras direcionadas a pontos mais baixos da cidade, pois Santarém tem uma cota elevada e é privilegiada em não ter corpos d’água que impeçam o escoamento por gravidade, e se possível, conectar a nova rede nas galerias existentes na parte antiga da cidade (depois de desentupi-las) e ligar aos emissários sub-fluviais. Sem esses cuidados, teremos os mesmos problemas ocorridos em outras cidades do país. Não devemos repetir os mesmos erros penalizando a população; onde os governos mudam, mas é o povo que herda todos os problemas, sofrimentos e prejuízos por falta de planejamento.
Sugiro também a construção de infraestruturas verdes como alternativas ecológicas do manejo das águas pluviais, imitando o ciclo hidrológico natural, que são as “áreas verdes” em espaços públicos livres que reduzem as enxurradas na área urbana.
O objetivo é criar um sistema de “áreas verdes” se possível ligadas entre si, com estruturas paisagísticas que auxiliam na drenagem urbana que são: jardins de chuvas; canteiro pluvial; lagoa pluvial ou de retenção; biovaletas; telhados e grades verdes, todas com a finalidade de retenção e infiltração pluviométrica, reduzindo as enxurradas e os alagamentos constrangedores.
Seria bom que lei municipal propusesse para as unidades pavimentadas na área urbana como; pátios e estacionamentos serem feitos com pavimento ecológico em bloquetes rejuntados com areia para possibilitar infiltração, e gramados com essa finalidade, o que diminuiria o volume de águas pluviais descartadas de telhados e do interior de áreas privadas para as ruas, e que toda unidade predial absorvesse suas águas pluviais dentro de seus próprios limites com poços absorventes, tendo um desconto em seus IPTU’s.
Uma curiosidade ecológica nos remete ao ano 18 a.C, quando Horácio, poeta latino, escreveu em suas Epístolas o seguinte: “Naturam expelias furca, tamen usque recurre”, ou seja, “Expulsas a natureza com uma forquilha, e ela retornará arrasadora”. Isto significa que o homem ao alterar a natureza sem planejamento, torna-se vítima da mesma, e às vezes com conseqüências fatais, pois se materializa a: “Vingança de Gaia”.
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* Santareno, é gestor ambiental e projetista. Escreve regularmente neste blog.