
No sábado, 5, aconteceu o TPM Festival. Em sua segunda edição, o Tudo Pelas Mulheres (tradução de TPM) tem a excelente proposta de expor a produção artística da mulherada da cidade e região.
O festival é iniciativa de um coletivo de mulheres que discute questões que estão na ordem do dia, em tempos de onda reacionária que tenta impor ao país retrocesso civilizatório.
Machismo, homofobia, transfobia; questões de gênero, igualdade de direitos e o direito de afirmar sua individualidade sem constrangimentos truculentos e moralistas. Essas são asbandeiras das meninas nada comportadas do TPM.
Felizes na escolha do local, orla da cidade no pequeno palco entre a quadra esportiva e o parque infantil, o evento teve como atração bandas de rock formadas por mulheres ou com a presença de mulheres. Mas não apenas isso. Pequena feirinha de produtos artesanais, roda de discussão sobre a presença das mulheres na cena cultural e artística e até sessão de terapia coletiva.
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Assistir à apresentação das meninas foi sem dúvida uma experiência muito agradável, além de surpreendente. Foram cinco apresentações. Excetuando-se a primeira, mais poprock, o que veio a seguir foi puro rock, punk, metal, pós punk e o pós-tudo das meninas da Godiva de Macapá, com composições autorais de mensagem sensível e direta, afinadas com a proposta do evento.
Festa de mulheres feministas onde homens podem ficar à vontade, inclusive tocar junto. Meninas sem frescuras, vestidas com suas armaduras de som, empunhando suas armas elétricas, transformado o palco em uma arena onde fazem explodir protestos e sentimentos positivos. E o vilão é o machismo e o preconceito. Atitude porrada. Sensibilidade à flor da pele.
É visível que muitas são instrumentistas iniciantes, abraçam a música como forma de arte que melhor amplifica o que pretendem expressar. Se falta técnica e virtuosismo, sobram coragem, atitude e consciência social.
Tudo isso é rock, tudo isso é punk, tudo isso é o canal por onde a juventude contemporânea verbaliza sua insatisfação e expressa sua visão de mundo.
O TPM é uma proposta que vai além dos limites da arte, que em si já é transformadora, promovendo discussões sobre comportamento, diversidade, respeito mútuo e novas perspectivas para a juventude. Rompendo as barreiras da desinformação e da apatia.
O festival revela a Santarém das tribos urbanas, onde podemos nos ver de frente com a contemporaneidade, muito cara à cidade que cultua por regra o folclore e a tradição, quase não há interlocução com as linguagens contemporâneas. A gestão e fomento cultural do município tradicionalmente toca o carro em frente olhando o retrovisor.
Mudar a concepção de cultura dos gestores culturais e do empresariado, que poderiam estar patrocinando iniciativas como o TPM Festival, é o desafio a ser superado. O fortalecimento de coletivos como o que produziu o TPM é o caminho. A sinergia entre os diversos coletivos e linguagens artísticas trocando ideias e somando forças é outra saída.
O fato negativo do festival foi a crônica falta de comprometimento dos técnicos de som quando prestam serviço para eventos alternativos que geralmente contam com o apoio do município. Agem como se estivessem fazendo um favor aos artistas. Isso acaba por interferir na qualidade do espetáculo. Falta de profissionalismo e respeito para com pessoas que estão começando e se expondo.
Mas nada disso tirou o brilho das garotas do festival. Superaram a falta de estrutura com coragem, atitude e pegada de gente que sabe o que quer e chega chegando. Garotas que dizem não à caretice até que esse não torne-se afirmação. No território amazônico das Amazonas, não poderia ser diferente.
— * Paulo Cidmil, santareno, é produtor e ativista cultural. Escreve regularmente neste blog.
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