Jeso Carneiro

Poetas amazônicos. Passarinho

Pousada

Um beijo em forma de passarinho
Pousou em minha janela, sozinho…
Como não abrir meu coração
Para esse passarinho se aninhar?

Meu coração não é gaiola
É apenas um aconchego
Um velho porto grego
À espera do navio passar…

Meu coração é ilha num oceano
De tantas Tróias vencidas
De tantas lendas perdidas
Que um dia irei contar…

Mas a ave que agora pousa
Me olha de frente, e ousa
Decantar seu canto livre
Como quem quer levitar…

E o beijo ganha contornos
Recheados de adornos
Corpo lindo de mulher
Que me faz apaixonar…

Já não sou de mim um náufrago
Nem tampouco homem trôpego
Que o vinho deslizou
Em tantas noites sem luar…

Olho a olho de menino
Do olhar, meu desatino
Que pergunta: “Por que te amo tanto?”
Numa angústia sem parar…

E respondo a mim mesmo
Sem pestanejar a esmo
O que algum poeta já disse:
Amo por que não há como não amar…

Pois se não és a singeleza
Muito menos a pureza
Que ninguém pode querer
Nestes mares encontrar…

Mas és um pássaro ferido
Ofegante e combalido
Que precisa urgentemente
Num repouso descansar

E se te agrada o meu cantinho
Que te esquente o meu ninho
E te deixe reluzente
Pronta pra cicatrizar…

Já não espero os passaredos
Agora só vivo com medo
Desse lindo passarinho
De repente querer voar…

Porque o horizonte é lindo
E outras aves que vão indo
Sonham ter o passarinho
Com suas asas acompanhar

Mas meu coração não é cela
Como diria Gabriela
De tanto cravo e canela
Que me fez retemperar…

Meu coração é o seu ninho
Retirante passarinho
Que eu quero acolher
No meu jeito de amar…

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De Jota Ninos, poeta amazônico nascido em Belém e naturalizado tapajônico.

Leia também dele:
Existência.
Languidez de menina.
Poeta.
Prece do ventre.
Inverossímel.

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