
O desembargador Luis Gonzaga Neto, da Seção de Direito Público, do TJ (Tribunal de Justiça) do Pará, concedeu nesta terça-feira, 24, liminar o reintegrando ao cargo o prefeito de Tucuruí, Artur Brito, do PV.
Brito estava afastado do cargo por conta de duas ações oferecidas pelo Ministério Público do Pará.
Também foram reintegrados aos cargos o chefe de gabinete Wilson Wischansky e o secretário de Obras, Florivaldo Vieira Martins.
Quem até então estava no comando do Executivo era o presidente da Câmara de Vereadores de Tucuruí, Bena Navegantes (Pros).
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Abaixo, a íntegra da decisão.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ
PROCESSO Nº 0802152-31.2017.8.14.0000
ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
RECURSO: AGRAVO DE INSTRUMENTO.
COMARCA: TUCURUÍ (1.ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL)
AGRAVANTE: ARTHUR DE JESUS BRITO
ADVOGADO: DENIZE MELO DA SILVA OAB/PA Nº 20.843
AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ (PROMOTOR DE JUSTIÇA AMANDA LUCIANA SALES LOBATO)
PROCURADOR DE JUSTIÇA: NELSON PEREIRA MEDRADO
INTERESSADO: MUNICÍPIO DE TUCURUÍ
ADVOGADO: RAFAEL PERON – OAB/PA 19.681
RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO, interposto por ARTHUR DE JESUS BRITO, contra decisão interlocutória proferida pelo MM. Juízo da 1º Vara Cível e Empresarial da Comarca de Tucuruí, nos autos da nos autos da Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa (nº. 0015262-44.2017.8.14.0061) movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO, ora agravado, que deferiu o pedido liminar sob o argumento de indícios da existência de atos de improbidade por partes dos requeridos e, dentre várias medidas, afastou o agravante do cargo de Prefeito Municipal de Tucuruí.
A decisão agravada cinge-se nos seguintes termos, in verbis:
“(…) Sinto-me, por todo o exposto, e com espeque em tudo o quanto dos autos se constata, autorizado a decidir favoravelmente ao Ministério Público Estadual, deferindo, por conseguinte, o pedido liminar formulado pelo Órgão Ministerial e:
1. Afasto o senhor ARTUR DE JESUS BRITO do cargo e do exercício de suas funções de Prefeito Municipal de Tucuruí por tempo necessário à instrução e julgamento da presente ação civil pública, ou seja, 180 (cento e oitenta) dias, SEM PREJUÍZO DE SUA REMUNERAÇÃO, em estrita consonância com os termos do artigo 20, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.429/92;
2. Afasto os senhores FLORIVALDO VIEIRA MARTINS e WILSON WISCHANSKY do cargo e do exercício de suas funções de Secretário de Obras da Prefeitura Municipal de Tucuruí e o Chefe de Gabinete da Prefeitura Municipal de Tucuruí por tempo necessário à instrução e julgamento da presente ação civil pública, ou seja, 180 (cento e oitenta) dias, SEM PREJUÍZO DE SUAS REMUNERAÇÕES, em estrita consonância com os termos do artigo 20, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.429/92;
3. Para fins de instrução do presente feito, PROÍBO o acesso às repartições e prédios públicos municipais pelos senhores ARTUR DE JESUS BRITO, FLORIVALDO VIEIRA MARTINS e WILSON WISCHANSKY;
4. Decreto a quebra do sigilo fiscal dos Requeridos para que a Receita Federal do Brasil traga para os autos as declarações completas de Imposto de Renda da Pessoa Física dos Requeridos referentes aos últimos dois exercícios fiscais;
5. Decreto a quebra de sigilo bancário dos Requeridos para que o Banco Central do Brasil traga para os autos as operações financeiras realizadas nos últimos dois anos, incluindo-se as operações com cartão de crédito;
6. Determino o bloqueio e torno indisponíveis as contas correntes, poupanças, investimentos financeiros e todo o patrimônio mobiliário e imobiliário havidos em nome de ARTUR DE JESUS BRITO, FLORIVALDO VIEIRA MARTINS e WILSON WISCHANSKY, se houverem, para o fim de tornar indene o erário público, em caso de comprovado enriquecimento ilícito ou prejuízos provocados aos cofres públicos; (…)”
Preliminarmente, almeja a suspensão da ação de origem em face da repercussão geral que trata da aplicação da Lei 8.429/92 aos Prefeitos.
Aduz que o magistrado de piso, sem provas para autorizar o afastamento do gestor público, antecipou a sentença emitindo juízo de valor sobre o mérito da ação e condenou antecipadamente o agravante por atos improváveis, indo de encontro com ditames da lei especial que regula as ações por atos de improbidade administrativa que só concordam com a aplicação das providências determinadas quando os indícios de interferência da instrução processual estão cabalmente provados, o que não seria o caso.
Alude que o juiz a quo ignorou os procedimentos aplicáveis às normas de registro e autuação de processos, agilizando a tramitação da ação e intimou as partes sem que o processo tivesse sido devolvido à Secretaria para as providências de praxe, que só foram levadas a efeito no dia 14/11/2017, em ofensa ao devido processo legal.
Ressalta que o juiz de primeiro grau não estava apto a proferir a decisão agravada ou realizar qualquer atividade jurisdicional no Município de Tucuruí desde 01/11/2017, pelo que a decisão por ele prolatada, em 13/11/2017, configura ilegalidade congênita e insanável, tornando-a inexistente e, por não existir no mundo jurídico a tutela concedida por juiz afastado da jurisdição deve ser desconsiderada por essa colenda Corte.
Enfatiza a falta de isenção nos depoimentos prestados por Alexandre França Siqueira e Mariza Silva da Costa que serviram de base para que o parquet ajuizasse a ação de improbidade em desfavor do agravante, bem como a inexistência de irregularidades no ato administrativo de rescisão dos contratos do Município de Tucuruí com a empresa Siqueira Locações Ltda.
Alega que as demais alegações constantes na petição inicial nada provam que o agravante esteja ou tenha praticado conduta ímproba, aliás, a maior parte data de período anterior à sua assunção ao cargo.
Pontua que o Decreto 048/2017, elaborado para contingenciar despesas, não assinala o corte de gastos estabelecidos de forma legal, mas tão somente aqueles que estão sobrecarregando as contas públicas. Trata-se, portanto, de um instrumento de controle interno da administração para evitar gastos desordenados e desnecessários.
No que concerne à falta de atualização do Portal da Transparência, ressalta o recorrente que a questão não configura improbidade administrativa, mas mera irregularidade de caráter formal a supor uma hipotética ilegalidade, que não pode ser confundida com prática de improbidade administrativa.
Aduz que a garantia da instrução processual é o único motivo que a lei especial autoriza o afastamento do gestor, e a obstrução da instrução deve restar indene de dúvidas, porém, todos os fatos foram denunciados de forma unilateral, tomados como verdades absolutas em um procedimento de cognição sumária que sequer oportunizou o exercício do contraditório.
Alega que a ameaça de testemunhas, a destruição de documentos, o dificultar na realização de perícias, e quaisquer outros motivos que deturpem a produção de provas, nada disto foi efetivamente demonstrado, nem de que modo o agravante pode atrapalhar o curso da instrução processual caso permaneça na chefia do Poder Executivo de Tucuruí.
Ante esses argumentos, requer a suspensão da Ação Civil Pública por Atos de Improbidade Administrativa (Processo nº 0015262-44.2017.8.14.0061), até decisão final do Supremo Tribunal Federal acerca do tema de repercussão geral no RE nº 976566, sobre a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992) aos Prefeitos.
Alternativamente, almeja que seja reconhecida a inexistência da decisão agravada, proferida por juiz afastado da jurisdição de Tucuruí e, caso indeferidos os pedidos acima, pleiteia a concessão do efeito suspensivo para sobrestar o decisum guerreado. Ao final, requer o provimento do recurso, reformando a decisão de 1.º grau.
Em despacho, este Relator reservou-se para apreciar o pedido de efeito suspensivo após as contrarrazões do agravado e determinou a sua intimação para apresentar contrarrazões.
Em decisão, neguei o pedido de reconsideração elaborado pelo recorrente, mantendo o despacho por mim exarado para determinar a intimação da parte Agravada para apresentar contrarrazões e a expedição de ofício ao Juiz de primeiro grau para prestar as informações necessárias.
O juiz a quo prestou informações, relatando, inclusive, que se averbou suspeito para julgar o processo de origem.
O Ministério Público apresentou parecer apenas sobre as preliminares levantadas no presente recurso e aduziu que a maioria dos argumentos que se referem ao mérito do recurso não foram submetidos ao crivo do contraditório, o que impede uma manifestação mais consistente deste representante ministerial, como fiscal da lei.
Ressaltou, ainda, o Parquet, que havendo impossibilidade de intimação pessoal por meio eletrônico decorrente de motivo técnico, o ato processual de intimação do Promotor Natural deve ser praticado segundo as regras ordinárias, sob pena de nulidade, nos termos do art. 5º, §5º da Lei 11.419/2006.
Em decisão interlocutória, indeferi o efeito suspensivo pleiteado.
Em novo despacho, com o fito de afastar qualquer empeço ao exercício do ato processual, devolvi o prazo ao douto parquet para apresentar contrarrazões, determinando aquele órgão proceder com suas comunicações internas.
O agravante, então, interpôs Agravo Interno em face da decisão que indeferiu o pedido de tutela recursal.
Em nova manifestação acerca do oferecimento das contrarrazões recursais, o representante do Ministério Público suscitou, novamente, sua impossibilidade de se manifestar como parte nos autos.
Ato contínuo, o recorrente pleiteou a desistência do aludido Agravo Interno, tendo sido homologado por este Relator.
Após, o presente feito foi incluído na pauta de julgamento desse E. Tribunal do dia 19/04/2018 para julgamento do mérito recursal, mas o processo, após petição protocolizada (Id. 536782) pelo Município de Tucuruí requerendo o seu ingresso na condição de assistente litisconsorcial, e juntada aos autos eletrônicos às vésperas da aludida sessão, foi retirado de pauta por este Relator para que as partes sejam previamente intimadas do que fora suscitado, de acordo com o que preceitua o art. 120 do NCPC.
Destaco, ainda, que em consulta ao Sistema de Gestão de Processos Judiciais do Poder Judiciário do Pará – LIBRA procedida pela minha assessoria foi obtida informação de que o processo de origem, ajuizado no ano de 2017, ainda encontra-se em fase inicial, tendo a decisão que recebeu a exordial da ação civil pública pela prática de ato de improbidade, proferida em 26/03/2018.
É o relatório.
DECIDO
Cumpre salientar, desde logo, que proferi decisão no agravo de instrumento (nº. 0801185-49.2018.814.0000) interposto pelo agravante em face do Ministério Público Estadual, nos autos da Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa (nº. 0001262-05.2018.8.14.0061), distribuído à minha relatoria, que teve o pedido de efeito suspensivo, parcialmente, concedido apenas para sobrestar a parte do comando que determinou o afastamento do recorrente, determinando o retorno do cargo e do exercício de suas funções de Prefeito Municipal de Tucuruí, mantendo os demais termos do provimento cautelar, até o pronunciamento definitivo do Colegiado.
É importante frisar, ainda, que a demora no andamento processual deve-se ao fato das informações que foram necessárias para a análise do pleito, conforme relatado alhures.
Pois bem, analisando detidamente as razões recursais, observa-se, neste juízo de cognição sumária, que há elementos de convicção suficientes a ensejar, parcialmente, a concessão de efeito suspensivo sobre a decisão a quo, pelas razões que seguem.
De início, destaco que a questão devolvida a este juízo cinge-se em averiguar o retorno do agravante ao cargo de Prefeito do Município de Tucuruí.
Nesse contexto, releva pontuar que o afastamento cautelar do Chefe do Executivo Municipal somente se legitima como medida excepcional, quando for manifesta sua indispensabilidade, desde, além disso, que observados os princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, não sendo vislumbrado na situação em apreço a necessidade de afastamento na atual fase processual.
Vale lembrar que a retirada temporária de agente público ou autoridade administrativa do exercício do cargo – previsto no art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429 /92 – é medida drástica e extrema, que deve ser aplicada somente quando se fizer absolutamente necessária para não prejudicar a instrução processual.
Na mesma linha é o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, que sedimentou o seguinte:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO DO AGENTE PÚBLICO DO EXERCÍCIO DO CARGO. RISCO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL. REQUISITO NÃO DEMONSTRADO.
1. “A norma do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de 1992, que prevê o afastamento cautelar do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa, só pode ser aplicada se presente o respectivo pressuposto, qual seja, a existência de risco à instrução processual” (AgRg na SLS 1.558/AL, Rel. Ministro Ari Pargendler, Corte Especial, DJe 6/9/2012). A mera menção à relevância ou posição estratégica do cargo não constitui fundamento suficiente para o respectivo afastamento cautelar.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 472.261/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/06/2014, DJe 01/07/2014)
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“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO CAUTELAR DA FUNÇÃO PÚBLICA. ART. 20, § ÚNICO, DA LEI 8.429/92. MEDIDA EXCEPCIONAL. NECESSIDADE NÃO EVIDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO.
1. É assente na jurisprudência desta colenda Corte Superior de Justiça que o afastamento cautelar do agente público de sua função, com fundamento no art. 20, par. único da Lei 8.429/92, é medida excepcional, que somente se justifica quando o comportamento do agente, no exercício de suas funções, possa comprometer a instrução do processo. Precedentes: AgRg na SLS 1.563/MG, CE, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJe 6.6.2012, AgRg no REsp. 1.204.635/MT, 2T, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 14.6.2012, REsp. 929.483/BA, 1T, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.12.2008, REsp. 993.065/ES, 1T, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 12.3.2008. Ressalte-se que a relevância do cargo ou a posição estratégica do cargo não é razão suficiente, por si só, para o afastamento.
2. No caso em apreço, o Tribunal a quo, amparado nas peculiaridades do caso concreto, se manifestou de forma fundamentada sobre a desnecessidade de afastamento cautelar da recorrida; a análise da situação processual evidencia o acerto dessa conclusão, por isso que não está a merecer qualquer ressalva, reprimenda ou retoque.
3. Recurso Especial do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS desprovido.”
(REsp 1197807/GO, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/09/2013, DJe 14/11/2013)
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AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA. GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA. INEXISTÊNCIA. INDEVIDA UTILIZAÇÃO COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. PEDIDO DE SUSPENSÃO INDEFERIDO. AÇÃO DE IMPROBIDADE.
PREFEITO MUNICIPAL. AFASTAMENTO DO CARGO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I – Na linha da jurisprudência desta Corte, não se admite a utilização do pedido de suspensão exclusivamente no intuito de reformar a decisão atacada, olvidando-se de demonstrar o grave dano que ela poderia causar à saúde, segurança, economia e ordem públicas.
II – In casu, os agravantes não demonstraram, de modo preciso e cabal, a grave lesão à ordem pública, sendo insuficiente a mera alegação de que a manutenção do decisum atacado teria o condão de provocar prejuízos ao Poder Público. Precedentes do STJ e do STF.
III – O afastamento temporário de prefeito municipal, com base no art. 20, parágrafo único, da Lei n. 8.249/1992 e decorrente de investigação por atos de improbidade administrativa não tem o potencial de, por si, causar grave lesão aos bens jurídicos protegidos pela Lei n. 8.437/1992.
Agravo regimental desprovido.
(AgRg na SLS 1.662/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/12/2012, DJe 01/02/2013)
Isso porque, a medida de afastamento do agente público é excepcionalíssima, ou seja, somente autorizada se estiver em estrita consonância com o que estabelece o art. 20 da Lei n.º8.429/92, in verbis:
Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.
Na origem, o Ministério Público Estadual ingressou com ação civil pública contra o agravante e demais réus, por entender haver ocorrido atos de improbidade administrativa na Prefeitura Municipal de Tucuruí, descritos na Lei Federal nº 8.429/92, com o fim de evitar a dilapidação do patrimônio público, a fraude em certames licitatórios, a supressão de direitos dos servidores públicos municipais e outras práticas ilícitas imputadas aos requeridos, na forma dos artigos 9º, VI e 10º, I, V e VIII, da LIA.
Da análise da decisão agravada, verifica-se que o fundamento utilizado para o afastamento cautelar do gestor municipal – “(…)É fato que o detentor de um dos poderes da União exerce influência positiva ou negativa sobre a pessoa de seus subalternos, podendo, na hipótese, haver a manipulação ou a perda de provas, não sendo razoável manter o Prefeito Municipal e os demais Requeridos no exercício de seus cargos e funções, sob pena de prejuízos à instrução do feito(…)” -, não se sustenta nos termos em que proferido, uma vez que a hipotética possibilidade de sua ocorrência não legitima medida dessa envergadura, qual seja, de afastar um detentor de cargo eletivo.
Com efeito, não há qualquer situação plausível alegada pelo Ministério Público que demonstre, inequivocamente, a intenção deliberada do agravante e demais réus em obstruir o andamento do processo e/ou sua instrução.
Nesse sentido, observa-se que a medida de afastamento somente é válida quando se fizer necessária à manutenção da regularidade da instrução processual, conforme a dicção legal corroborada pela lição de Pedro Roberto Decomain:
“Não se trata de autorização para afastamento do agente do cargo, emprego ou função, com o propósito de evitar que cometa novos atos de improbidade administrativa. (…) O dispositivo afirma que o afastamento pode ser ordenado sempre que a providência se mostre necessária para a instrução processual. Desta sorte, a razão de ser a justificar tal afastamento haverá que residir na possibilidade que o agente tenha, de influir de modo pernicioso na produção da prova. Sempre que, em permanecendo no exercício do cargo, emprego ou função, possa, pelas providências que isso lhe propicie, por exemplo destruir documentos ou outras evidências, exercer influência sobre testemunhas, eventualmente subordinados seus, ou tomar qualquer outra atitude capaz de pôr a perder a prova da ocorrência da improbidade, o seu afastamento do cargo, emprego ou função poderá ser decretado.” (in Improbidade Administrativa, 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2014. p. 354)
Na mesma linha é o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, que sedimentou o seguinte:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
AFASTAMENTO DO AGENTE PÚBLICO DO EXERCÍCIO DO CARGO. RISCO À INSTRUÇÃO PROCESSUAL. REQUISITO NÃO DEMONSTRADO.
1. “A norma do art. 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429, de 1992, que prevê o afastamento cautelar do agente público durante a apuração dos atos de improbidade administrativa, só pode ser aplicada se presente o respectivo pressuposto, qual seja, a existência de risco à instrução processual” (AgRg na SLS 1.558/AL, Rel. Ministro Ari Pargendler, Corte Especial, DJe 6/9/2012). A mera menção à relevância ou posição estratégica do cargo não constitui fundamento suficiente para o respectivo afastamento cautelar.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 472.261/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/06/2014, DJe 01/07/2014)
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“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AFASTAMENTO CAUTELAR DA FUNÇÃO PÚBLICA. ART. 20, § ÚNICO, DA LEI 8.429/92. MEDIDA EXCEPCIONAL. NECESSIDADE NÃO EVIDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO.
1. É assente na jurisprudência desta colenda Corte Superior de Justiça que o afastamento cautelar do agente público de sua função, com fundamento no art. 20, par. único da Lei 8.429/92, é medida excepcional, que somente se justifica quando o comportamento do agente, no exercício de suas funções, possa comprometer a instrução do processo. Precedentes: AgRg na SLS 1.563/MG, CE, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJe 6.6.2012, AgRg no REsp. 1.204.635/MT, 2T, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJe 14.6.2012, REsp. 929.483/BA, 1T, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.12.2008, REsp. 993.065/ES, 1T, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 12.3.2008. Ressalte-se que a relevância do cargo ou a posição estratégica do cargo não é razão suficiente, por si só, para o afastamento.
2. No caso em apreço, o Tribunal a quo, amparado nas peculiaridades do caso concreto, se manifestou de forma fundamentada sobre a desnecessidade de afastamento cautelar da recorrida; a análise da situação processual evidencia o acerto dessa conclusão, por isso que não está a merecer qualquer ressalva, reprimenda ou retoque.
3. Recurso Especial do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS desprovido.”
(REsp 1197807/GO, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/09/2013, DJe 14/11/2013)
Vale ressaltar que a observância dessas exigências se mostra ainda mais pertinente em casos de mandato eletivo, cuja suspensão, considerada a temporariedade do cargo e a natural demora na instrução nas ações de improbidade, pode, na prática, acarretar a própria perda definitiva do mandato.
Diante desse quadro, verifica-se presente probabilidade de provimento do recurso para a concessão do pleito de recondução ao cargo, de vez que não restou comprovado que o agravante tenha obstado, interferido ou embaraçado, até o presente momento, a instrução processual.
Já o perigo da demora está corporificado no fato do agravante estar impedido de exercer o cargo para o qual foi regularmente eleito pela população de Tucuruí.
Desse modo, reconsidero o entendimento para que seja suspenso os efeitos da decisão combatida, apenas no que se refere ao afastamento cautelar do Sr. Prefeito e demais agentes públicos afastados de suas funções, nada impedindo que, no decorrer da ação civil pública, uma vez reconhecido que encontram-se obstaculizando a produção de provas, a medida acautelatória seja de pronto imposta.
No que tange à decretação de quebra do sigilo fiscal e bancário, ressalto que a Lei Complementar nº 105/2001 dispõe sobre a sua possibilidade quando necessária para apuração da ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial, em especial nos crimes contra a Administração Pública.
Não obstante a previsão constitucional inviolabilidade de dados, aí incluídos dados bancários e fiscais, essa não é uma garantia absoluta e pode ser relativizada por medida judicial nos casos previstos na lei.
Quanto à insurgência sobre a indisponibilidade de bens, acredito que esta deva prevalecer, nos termos da fundamentação apresentada no decisum a quo.
Segundo o artigo 7º da Lei nº8.429/1992, a indisponibilidade de bens é viável quando o ato de improbidade administrativa causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, devendo recair sobre o necessário que assegure o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.
Nessa direção, é desnecessária a prova do periculum in mora concreto, ou seja, de que o réu estaria dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, conforme se encontra consolidado em precedente do Superior Tribunal de Justiça, que apreciando o tema sob regime de recurso repetitivo, ementou:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. APLICAÇÃO DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 543-C DO CPC. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DOS BENS DO PROMOVIDO. DECRETAÇÃO. REQUISITOS. EXEGESE DO ART. 7º DA LEI N. 8.429/1992, QUANTO AO PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. MATÉRIA PACIFICADA PELA COLENDA PRIMEIRA SEÇÃO.
1. Tratam os autos de ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal contra o ora recorrido, em virtude de imputação de atos de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992).
2. Em questão está a exegese do art. 7º da Lei n. 8.429/1992 e a possibilidade de o juízo decretar, cautelarmente, a indisponibilidade de bens do demandado quando presentes fortes indícios de responsabilidade pela prática de ato ímprobo que cause dano ao Erário.
3. A respeito do tema, a Colenda Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 1.319.515/ES, de relatoria do em. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Relator para acórdão Ministro Mauro Campbell Marques (DJe 21/9/2012), reafirmou o entendimento consagrado em diversos precedentes (Recurso Especial 1.256.232/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19/9/2013, DJe 26/9/2013; Recurso Especial 1.343.371/AM, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/4/2013, DJe 10/5/2013; Agravo Regimental no Agravo no Recurso Especial 197.901/DF, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 28/8/2012, DJe 6/9/2012; Agravo Regimental no Agravo no Recurso Especial 20.853/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 21/6/2012, DJe 29/6/2012; e Recurso Especial 1.190.846/PI, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16/12/2010, DJe 10/2/2011) de que, “(…) no comando do art. 7º da Lei 8.429/1992, verifica-se que a indisponibilidade dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário, estando o periculum in mora implícito no referido dispositivo, atendendo determinação contida no art. 37, § 4º, da Constituição, segundo a qual ‘os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível’. O periculum in mora, em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92. Assim, a Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes tráfegos, ocultamento ou dilapidação patrimoniais, possibilitados por instrumentos tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo, buscou dar efetividade à norma afastando o requisito da demonstração do periculum in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art. 789 do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem assim do acréscimo patrimonial ilegalmente auferido”.
4. Note-se que a compreensão acima foi confirmada pela referida Seção, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Divergência no Recurso Especial 1.315.092/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 7/6/2013.
5. Portanto, a medida cautelar em exame, própria das ações regidas pela Lei de Improbidade Administrativa, não está condicionada à comprovação de que o réu esteja dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora encontra-se implícito no comando legal que rege, de forma peculiar, o sistema de cautelaridade na ação de improbidade administrativa, sendo possível ao juízo que preside a referida ação, fundamentadamente, decretar a indisponibilidade de bens do demandado, quando presentes fortes indícios da prática de atos de improbidade administrativa.
6. Recursos especiais providos, a que restabelecida a decisão de primeiro grau, que determinou a indisponibilidade dos bens dos promovidos.
7. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e do art. 8º da Resolução n. 8/2008/STJ.
(REsp 1366721/BA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014, DJe 19/09/2014)
Na espécie, como substancialmente narrado pelo Órgão Ministerial, na inicial da ação civil pública, os atos de improbidade administrativa praticados pelos requeridos causaram grave lesão ao erário do município, ocasionando, por efeito, o suposto enriquecimento ilícito do agravante e dos demais envolvidos.
Assim, diante da existência de fortes indícios da sua responsabilidade na prática de atos de improbidade, bem como a necessidade de garantir o ressarcimento ao erário municipal, concluo pela manutenção da decretação de indisponibilidade dos bens, os quais conferem efetividade a eventual provimento futuro, sob pena de seu total esvaziamento.
Ante o exposto, com fulcro nos artigos 995, § único e 1.019, I, ambos do NCPC, em atenção ao restrito âmbito de cognição sumária, defiro parcialmente o efeito suspensivo, para sobrestar a decisão de 1º grau, somente quanto ao afastamento do Sr. Artur de Jesus Brito (Prefeito Municipal de Tucuruí), Sr. Florivaldo Vieira Martins (Secretário de Obras da Prefeitura Municipal de Tucuruí) e Sr. Wilson Wischansky (Chefe de Gabinete da Prefeitura Municipal de Tucuruí), devendo os supracitados agente públicos retornarem aos seus cargos, mantendo-se os demais termos do provimento cautelar, inclusive no que pertine à indisponibilidade de seus bens, até o pronunciamento definitivo do Colegiado.
Esclareça-se que a presente decisão tem caráter precário, cujo deferimento do efeito suspensivo ao recurso não configura antecipação do julgamento do mérito da ação, não constitui e nem consolida direito, podendo, perfeitamente, ser alterado posteriormente por decisão colegiada ou mesmo monocrática do relator.
Considerando, ainda, que o ente municipal pretende o ingresso no presente feito na condição de assistente litisconsorcial e, tendo em vista o que preceitua o art. 120 do NCPC acerca da assistência, bem como atendendo as novas diretrizes dos artigos 7º e 10 do CPC/15, intimo as partes, agravante e agravado, para querendo, no prazo comum de 15 (quinze) dias, se manifestem acerca da admissão ao feito requerida pelo peticionante.
À secretaria para os devidos fins.
Por fim, retornem-me conclusos para ulteriores.
Publique-se. Intime-se.
Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO.
Belém, 24 de abril de 2018.
DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
RELATOR
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