Uma história de amor sem ponto final

Publicado em por em Artigos

por Helvecio Santos

Uma história de amor sem ponto final, por Helvécio SantosÉ uma história anciã, do século passado!

Sessenta anos é um bom tempo, e haja tempo. Na verdade, é uma vida!

Não sei precisar o mês, mas foi no ano de 1956 que mamãe e papai, em busca de estudos para nosso irmão mais velho, hoje médico em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, colocaram sete filhos e mais cinco agregados a bordo do nosso valente barco Miragem, movido por um Archimedes 12hp, de popa e, Rio Amazonas abaixo, descobrimos Santarém e batemos com o costado ali no bairro da Aldeia, precisamente 24 de Outubro, a duas casas da esquina da 2 de Junho.

Novidades? Muitas!

Água pegada das 15:00 às 17:00h na bica da rua; luz elétrica entre 19:00 e 21:00h; picolezeiro e rala rala atrapalhando a sesta dos mais velhos; arraial da padroeira, Senhora da Conceição e do padroeiro do bairro, São Raimundo; banho de rio sem medo de piranha; praia que era uma imensidão só, e o barrento do Amazonas dera vez ao cristalino do Tapajós, entre outras novidades.

A Aldeia era reduto dos jogadores do São Raimundo e não era preciso sorte para espiar de passagem o Goitinho, o Cacete, o Chico Bóia, o Flexa, o Tiago tantos outros.

Mas uma coisa devo confessar: desde que cheguei a Santarém, não sei porque cargas d´àgua, o nome São Francisco soava mais sonoro e mais familiar a meus ouvidos, mesmo não tendo chances de espiar, mesmo que de passagem, alguma estrela daquele time que à simples referência do seu nome, já então me fascinava …coisas que só a espiritualidade explica.

Tempos depois, na mesma rua nos mudamos para o centro da cidade e um pouco mais maduro, juntamente com minha mãe, fazia compras no Mercado Municipal, localizado onde hoje fica a loja Y.Yamada.

Como não havia o Cais e nem a Avenida Tapajós, construídos na década de 80 passada, na vazante comprava-se peixe na praia que ficava em frente ao Mercado e na cheia na escadaria que acessava a dita praia.

Se os jogadores do São Raimundo brotavam aos montes na Aldeia, onde foi nossa primeira residência, os do São Francisco vinham mais da Prainha e das imediações do Estádio Municipal Adherbal Caetano Corrêa, depois, acertadamente e por questão de justiça, Elinaldo Barbosa. Hoje, o que um dia foi o estádio, é um terreno abandonado ao lado da Escola São Francisco.

A mudança para o centro da cidade facilitou-me a vida em todos os sentidos e mesmo que tivesse que “engolir” o Getúlio, nosso vizinho e um dos craques do Pantera de então, em meus giros pelas redondezas e em minhas idas ao Mercado, vez por outra cruzava com Beleza Preta, Batista, Canguru, Búfalo, Taro, Dedê, Aloisio, Adilson e tantos outros craques do LEÃO.

Se antes era uma ligação espiritual, a visão e a proximidade dos meus ídolos materializou o meu ideal futebolístico, viralizando em mim e azulando, definitivamente e para todo o sempre, meu corpo e minha alma.

Como minha família não era abastada e mesmo porque não fazia parte da cultura de meus pais, mesada era um “verbo” que não se conjugava lá em casa.

Então, como fazer para assistir aos bailes que sob a batuta do competente e mágico maestro Mindó, a orquestra AZUL promovia, enchendo dos mais belos acordes as tardes futebolísticas santarenas?

O jeito era contar com um ou outro jogador que nos quisesse botar para dentro do estádio ou, supremo esforço em prol da boa causa, “furar” a vigilância pulando o muro do lado da Escola São Francisco e contar com a sorte de não ser pego por algum vigia, o que seria uma vergonhosa expulsão para fora do estádio, não sem antes a aplicação de uns bons “cascudos”.

Bibico, uma das mais belas “bicicletas” que vi na vida, era um dos que amontoava a molecada à sua frente e colocava para dentro do estádio.

Se algum empecilho criassem, condicionava sua entrada no estádio à companhia da malta mirim à sua frente. Craque, era garantia de ingresso.

Tempos depois o encontrei no Rio de Janeiro, morando no Catete e tendo como testemunha uns bons chopinhos, agradeci a gentileza que nos fazia. Rimos muito lembrando aquela época.

O tempo, senhor da razão e das boas causas, fez com que um dia fosse eu a colocar a molecada para dentro do estádio. Sim, fiz isso e até “comprei” briga com os porteiros que me queriam negar o sublime dever de devolver o que a vida um dia fez por mim.

Entre craques do gabarito de Jeremias, Da Silva, Pão Doce, Chardival, Navarrinho, Cabecinha, Xabregas, Edmar, Maromba, Dias, Acari, Guajará, Valdo e tantos outros, lá estava eu, como num sonho, envergando a camisa do meu LEÃO e fazendo-a, com o meu suor repleto do mais puro amor, que seu AZUL fosse mais AZUL.

E “entre fogos canções e alaridos”, por sua história e sua luta consagra-se como o clube mais longevo e o maior detentor de títulos santarenos.

Mas a vida não é só bonança e um dia esse portentoso LEÃO quase foi à lona e neste espaço não cabe enumerar culpados.

Abnegados juntaram forças e, como um mantra, a letra da música se fez ouvir a todo momento: “um grande amor não vai morrer assim”. Fênix, renascido das cinzas pelas mãos de Agostinho Coleta do Couto, Edi Ribeiro, Bruno Moura, Nerivaldo Cesar e outros mais, cá estamos nós, mais fortes do que antes e mais provado e curtido no amor dos que o querem infinitamente bem.

A sede? Embora hoje tenhamos, isso é o de menor importância…a época da carência do imóvel nos provou que a mais bela sede é o coração de todos que o amam.

Neste sábado, dia 16, precisamente às 19:30h, o Colosso do Tapajós será novamente o palco dessa fabulosa máquina AZUL.

Ganhar? Perder? É só um detalhe. O Estádio estará todo AZUL, o AZUL do Amazonas, o AZUL do Tapajós, o AZUL da Santa, Senhora da Conceição, que abençoa todos e nos dá sua proteção.

Novo regente, orquestra renovada, a mesma paixão!

Aqui de longe, torço! Hoje não mais posso dar o viço da juventude de minhas pernas em busca da glória que o LEÃO merece. Pela distância que me encontro sequer minha voz se juntará às milhares que irão prestar homenagem a esse marco da cultura e da identidade santarena.

Lamento não poder assistir a essa prova coletiva de amor mas em pensamento, estarei aí.

Minha sogra deu-me uma plaquinha que mantenho sempre à vista em meu ambiente de trabalho. Nela está escrito “Tenha cuidado com o que você pensa, pois sua vida é dirigida pelos seus pensamentos” (Prov. 4:23).

Creio piamente no escrito e por todo o dia terei em meu pensamento: Avante, LEÃO! Vamos à vitória.


Publicado por:
É advogado e economista santareno, residente no Rio de Janeiro. Ex-jogador e torcedor do São Francisco.

13 Responses to Uma história de amor sem ponto final

  • Helvécio, somente hoje li tua crônica e fiquei feliz de saber sobre o Bibico. Ele foi do meu tempo de Dom Amando e era um cracasso. Chamavam-no de Pelé mocorongo. Pena que tenha encerrado a carreira cedo por causa de uma contusão que certamente seria fácil de curar com os recursos da medicina esportiva de hoje. Bela crônica e vamos esperar o Leão aqui contra o meu bicola.

  • É admirável o amor que tens pelo nosso leão azul, és fiel e sempre agradecido por tudo que conseguiu no tão amado São Francisco e nós seremos sempre fiel ao nosso Leão que o senhor nos ensinou a amar!!! Somos de uma geração azulina e esperamos ser do Leão Azul do estado do Tapajós !!! Te amo!!!

    1. Já somos LEÃO AZUL DO TAPAJÓS e isso é algo que não se explica. Somente, É! Beijos, minha querida sobrinha, te amo!!!

  • é dear petralha o choro é livre !!!!! pegaram uma sova na câmara que nem aquela que o poderoso canhão internacional papão da curuzú aplicou no leãozinho genérico da várzea !!!! tchau petralhas !!!! tchau querida !!!!! eu choro !!!!

  • “É no mínimo indecente que um processo de impeachment seja conduzido por quem e como é conduzido, já desde o seu primeiro ato como chantagem e vingança. É no mínimo indecente o conluio, com a indecência anterior, do partido que representa a cúpula social e econômica do país e, sobretudo, de São Paulo. É no mínimo indecente que, “ao se propor o impeachment sem cumprir os requisitos constitucionais de mérito” –palavras “em defesa da democracia” dos reitores das universidades federais–, se falsifique como crime uma prática contábil também de presidentes anteriores. E nunca reprovada. Por isso mesmo posta, desta vez, sob o apelido pejorativo de “pedaladas”, para ninguém entender. – Jânio de Freitas, em sua coluna de hoje na FSP

  • estamos aguardando essa leoa genérica para aplicar mais uma sova aqui em Belém !!! adoro ver surra do poderoso internacional canhão bicolor estraçalhar esses timecos de várzea !!!! a-do-ro !!!!

  • Reconhecidamente talentoso como jogador, Helvécio consegue repetir suas impecáveis atuações anos depois com o mesmo brilho, em outro campo – o literário. É o craque novamente em ação, para sorte dos seus velhos torcedores. Abs.

    1. Obrigado, Célio! Honra-me muito v. ser integrante dos meus “velhos torcedores”. Hoje, na arquibancada, esforço-me para destacar, mesmo que sem nunca conseguir por inteiro e estar longe disso, o brilho do nosso querido e eterno LEÃO AZUL DO TAPAJÓS. Daqui de longe aplaudo seu ímpar desempenho tanto no campo literário quanto no campo jurídico o que, amiúde, lhe conferem distinções. Receba minha admiração, sempre. Abraços,

  • Olá Osvaldino, concordo plenamente com vc pois não existe meio termo ou é ou não é. E ao meu caro Aquino, eu também aqui cheguei em 03/1959 e logo me apaixonei por Santarém e pelo meu TIGRÃO DA PRAINHA O NORTE CLUBE chegando a ser seu dirigente por + de uma década, reconheço que sempre fomos um celeiro descobridor de craques para o São Francisco por isto somos . considerados filial do mesmo. Lamento que o Leão foi mal administrado por isso perdeu o seu patrimonio maior, enquanto o meu TIGRÃO continua com o seu bem valorizado.

  • Esse é o Helvécio azulino!!! Aí sim, aí você domina todas, joga e deixa jogar! Faça-nos esse favor, Helvécio: continue falando só sobre futebol ou sobre as belezas de Santarém. Mas, por favor, não volte a falar sobre política, pois assim perderá um grande admirador de seus textos….Abraços, Helvécio.!!!

  • Meu prezado Helvécio,
    Comungo de boa parte de sua história, pois também ao chegar em Santarém no dia 01/03/1959 às 19:00 horas, vindo de Juruti, mais precisamente do Paraná de Dona Rosa, também me apaixonei por Santarém, sua gente e o nosso São Francisco.

    Hoje vamos estar juntos numa torcida só em favor de nosso aguerrido Leão Azul do Tapajós.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *