
O MPF (Ministério Público Federal) defendeu, perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), a continuidade das investigações contra Dirceu Sobrinho, o “Rei do Ouro”, e sua empresa, FD’Gold DTVM, por suspeita de lavagem de capitais em decorrência da compra de ouro de origem ilegal.
Por meio de embargos de declaração, o MPF sustenta a existência de indícios de falsa indicação de origem do ouro nos documentos cuja perícia embasou, em 2019, o arquivamento das investigações contra Dirceu e sua empresa no Pará.
Sobrinho e a FD’Gold, como é conhecida, são alvos de outras ações, sempre por comércio de ouro extraído ilegalmente da Amazônia, tendo uma delas, inclusive, levado o empresário à prisão preventiva no final de 2022.
Trancamento
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A FD’Gold vinha sendo investigada por suspeita de lavagem de capitais, em razão de aquisição de ouro em volume incompatível com o padrão de clientes de seu perfil, e com origens falsamente indicadas. Um inquérito policial foi instaurado contra a empresa pela Polícia Federal em Santarém, no Pará.
A defesa de Sobrinho conseguiu, na primeira instância judicial, o trancamento do processo por meio de habeas corpus. Com a interrupção, a investigação teve duração aproximada de três anos, tendo ocorrido entre 2016 e 2019.
O MPF entrou com recurso contra o arquivamento, negado pelo TRF1. A Corte acatou laudos periciais sobre os lançamentos de compra e venda do ouro e entendeu que não havia justa causa para a continuidade das investigações.
Histórico
Para o MPF, no entanto, a perícia meramente contábil é insuficiente para justificar a interrupção das investigações, especialmente levando-se em consideração o histórico de Sobrinho e sua empresa.
A FD’Gold é investigada, em ação civil pública, por ter supostamente movimentado, junto a outras empresas, mais de 4,3 mil quilos de ouro ilegal nos anos de 2019 e 2020. A fraude foi revelada pelo levantamento de imagens de satélite, que mostraram que as áreas declaradas pela empresa como sendo de exploração mineral estavam intactas, indicando a lavra em localidades diversas.
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O procurador regional da República José Robalinho Cavalcanti, que assina os embargos, reforça na peça que a decisão do TRF1 não enfrentou o argumento central do recurso ministerial: o fato de que um laudo contábil não tem aptidão para verificar a origem do ouro adquirido.
“Qual o sentido ou relevância de uma análise de pretensa conformidade meramente documental se a hipótese de investigação é, e sempre foi, de lavagem, por uso de documentos ideologicamente falsos e sem lastro na realidade, para ‘esquentar’ ouro lavrado ilicitamente?”, questiona.
Localidades diferentes
Segundo o pronunciamento do MPF, os indícios presentes no inquérito arquivado, considerados em conjunto com o modo de operação do empresário, desnudado em outras investigações, são suficientes para suspeitar que, pelo menos, parte das lavras ocorriam em localidades diferentes das afirmadas, o que não seria passível de ser detectado apenas por perícia contábil.
“Se os documentos não correspondem à realidade, a perícia nada prova acerca da ausência de crime, como pretendeu a sentença”, pontua.
Prisão na Aerogold
Sobrinho foi preso preventivamente no final de 2022, no âmbito da operação Aerogold, da Polícia Federal, que identificou esquema de exploração ilegal de ouro por balsas e dragas em rios da Amazônia.
Sua empresa, a FD’Gold, é investigada em ação civil pública por ter supostamente despejado no mercado nacional e internacional 1.370 quilos de ouro ilegal entre 2019 e 2020.
Além disso, uma carga de ouro da empresa foi apreendida pela Polícia Federal no Mato Grosso, também em 2020, por não apresentar as notas fiscais referentes.
O MPF acredita que esses acontecimentos são suficientes para justificar a retomada das investigações, dada a associação reiterada de Dirceu e da FD’Gold a atos ilícitos envolvendo a exploração e comercialização do ouro.
Destruição e impactos ambientais
O MPF aponta, ainda, para a gravíssima situação gerada pela extração ilegal de ouro na região norte do país, especialmente nos estados do Pará, Roraima e Amazonas.
O procurador titular do caso destaca que a atividade gera impactos tanto ambientais, com a destruição de ecossistemas, como nos modos de vida de populações indígenas, que sofrem consequências diretas da degradação ambiental, além de serem vítimas de reiteradas violências de garimpeiros que invadem suas terras para promover a exploração ilegal.
Como exemplo, o procurador cita a tragédia do povo Yanomami, que teve suas terras devastadas pelo garimpo, provocando a contaminação de recursos naturais e uma mortandade sem precedentes entre adultos e crianças.
Efeito vinculante: STF
O MPF também ressalta que o acórdão do TRF1 desconsiderou as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7.273 e 7.345. Nelas, a Suprema Corte suspendeu provisoriamente a eficácia do art. 39, §4º, da Lei 12.844/13, que presumia a legalidade na compra do ouro e boa-fé do adquirente.
O STF entendeu que a norma colaborava para o aumento do garimpo ilegal, com repercussão para a degradação ambiental e para a saúde indígena.
O procurador regional destaca que a decisão nas ADIs foi anterior ao julgamento pelo TRF1, razão pela qual devem ser levadas em conta. A decisão do Supremo, proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade, tem efeito vinculante, ou seja, deve ser aplicada no julgamento de todas as questões sobre o tema na Justiça brasileira.
Com informações do MPF
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