Lula foi eleito pela terceira vez presidente do Brasil. Sua vitória se deu sob uma margem apertada de votos e, como afirmou o próprio presidente, “foi a vitória de um imenso movimento democrático”. O resultado das urnas, além de garantir sua vitória, evidenciou um país dividido e polarizado.
Por isso, é justo comemorar e festejar a democracia, mas é bom lembrar que o trabalho de reconstruir o país deverá começar cedo. Bolsonaro deixa um país fragilizado, desigual e com as contas públicas muito debilitadas.
Além de assumir um país em crise, Lula terá que governar com uma forte oposição no Congresso Nacional, o que lhe exigirá grande capacidade de articulação. Aliás, esta capacidade de articulação será fundamental também para construir sua base política e equipe de governo.
- Leia também de Felipe Bandeira: Castelo de cartas e balcão de negócios: a política econômica de Bolsonaro nas eleições.
A despeito desses grandes desafios, Lula não pode ignorar uma agenda política urgente: promover crescimento econômico com redução da desigualdade e maior participação dos salários na renda nacional.
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Isso, evidentemente, não é uma tarefa fácil, pois coloca em confronto muitos grupos de interesses, alguns dos quais, que comporão o seu governo. Uma repactuação dos marcos das políticas econômicas será fundamental para o sucesso da sua gestão.
Se falhar, o espectro de Bolsonaro lhe lembrará constantemente que o autoritarismo pode ressurgir dos impasses econômicos e sociais de um país dividido.
Retomar o controle do gasto público é o ponto inicial dessa reconstrução. Para isso, terá que desmantelar o Orçamento Secreto, combater o Teto de Gastos (EC 92) e fazer do investimento público o protagonista da arrancada econômica.
Isso, por sua vez, exigirá uma reforma tributária e a remodelagem da base de arrecadação, com a correção de rota das onerosas política de isenção fiscal, para qual o apoio do Congresso será fundamental. Isso produzirá mais eficiência do gasto público e dará mais consistências para as políticas de desenvolvimento.
Terei a oportunidade – em outros textos – de falar com mais vagar de cada uma dessas questões.
- Religião e política: A aparição do diabo nas eleições do Brasil. Por Felipe Bandeira
Outro ponto crucial para a reconstrução do país será a valorização do salário mínimo, refinanciamento e amortizações das dívidas das famílias e implementação de uma política de formalização do trabalho.
O endividamento já alcança 79% das famílias brasileiras. Desde agosto deste ano, observou-se um aumento nas dívidas de cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja e empréstimo consignado.
Por outro lado, mesmo que tenha se observado uma redução do desemprego, que alcançou uma taxa de 9,3% no segundo trimestre de 2022, ainda assim, existem 10,1 milhões de pessoas desempregadas no país, somados a um contingente significativo de desalentados (4,3 milhões).
Fonte: https://www.ibge.gov.br/explica/desemprego.php
O desemprego e o endividamento das famílias representam um freio significativo ao crescimento econômico. Em termos materiais, isso se traduz na precarização das condições de vida, nas filas dos ossos e no aumento da fome e da miséria. Daí a importância de uma política efetiva de geração de emprego e renda.
Para isso, o governo Lula deverá reconstruir o equilíbrio fiscal e monetário equacionando investimento público, controle da inflação e manutenção de taxas de juros mais baixas. A Selic atualmente está em 13,75%, uma das maiores taxas básicas do mundo.
Em outras palavras, o governo deverá ter uma política de taxa de juros que esteja direcionada para expansão do investimento e da busca do pleno emprego e que seja compatível com uma inflação planejada.
Esse conjunto de políticas deverá está alinhado com os programas de transferência de renda e com o compromisso de redução da miséria. Hoje, estima-se que mais de 30 milhões de pessoas acordam e não sabem se vão fazer pelo menos uma refeição ao longo do dia. É uma situação dramática que piorou muito no governo Bolsonaro.
Políticas direcionadas para esse público, como o Bolsa Família e o Auxílio Brasil, mostram-se fundamentais, pois garantem recursos e meios de sobrevivência de forma imediata.
Como se pode ver, os desafios são enormes. É preciso desarmar as narrativas e estereótipos sobre a economia. Não, o Brasil não vai virar “uma” Venezuela ou Argentina. O Brasil também não será um país comunista.
Não foi a política de combate à pobreza e distribuição de renda que levaram esses países para uma crise profunda.
Esses argumentos servem para desinformar e cultivar um medo infundado na população, afinal, o Lula já governou por dois mandatos anteriormente e, nessa época, o país era conhecido pela diplomacia e arranjos políticos de repercussão internacional.
As filas dos ossos, inflação e o aumento brutal da desigualdade veio, sobretudo, a partir do governo Temer e se aprofundou com Bolsonaro. Foram os governos neoliberais que implementaram uma agenda econômica devastadora para a maioria da população.
Com Lula eleito, temos a oportunidade de reconstruir o Brasil. No campo econômico, essas são as tarefas imediatas para remediar uma sociedade febril e faminta. O caminho já começou a ser pavimentado, afinal, o amor venceu o ódio.
Texto do professor Felipe, perfeito; gosto por ser de fácil compreensão.