
Não consigo explicar como. Deve ser conspiração cósmica, só pode: o meu desejo e o desejo do pastor da Assembleia de Deus se cruzaram nesta semana.
Sem maledicências, por favor, comprometendo ainda mais o impecável terno, vilmente manchado, do religioso paraense. Explico.
Leio O Desejo, do filósofo francês Frédéric Lenoir há alguns dias. A obra radiografa as reflexões de pensadores sobre o desejo – desde Platão a René Girard, passando por Buda, Aristóteles, Epicuro, Espinosa, Nietzche, Freud, entre outros.
Nessa cruzada, eis que, lá fora das quatro linhas filosóficas, me deparo com fotos e vídeos íntimos do pastor, lançados no pasto a perder de vista das redes sociais, sites, blogs, portais. Sim, ele mesmo, réu confesso, refém do desejo.
∎ Leia também de Jeso Carneiro: Saiba por que Zé Maria não deu a cabeça de João Paiva ao PSB.
Prisioneiro, à sombra da tecnologia (whatsapp, face time, webcam), não de um desejo qualquer – da gula, da inveja, cobiça, preguiça… Mas aquele que é apontado como o pior dos desejos, seja por islâmicos, judeus, cristãos (e assembleiano, por tabela) e grande parte das religiões monoteístas: o desejo sexual.
Em trajes minúsculos (em alguns closes) ou nu, em cenas mais tórridas, viu-se o pastor no pleno gozo, no livre exercício de seus desejos, contracenando com uma fogosa ovelha desgarrada – que ele garante, por tudo que é mais sagrado, ser sua esposa. Menos mal: o living reservado aos adúlteros no inferno tem fama de ser o mais quente.
Mas, deixa pra lá. Motor da existência, os desejos, segundo Frédéric Lenoir, manipulam e moldam nossas atitudes e ideias. Freud, por exemplo, estava convencido de que o controle dos desejos e das pulsões era a marca da civilização. Colocaria, em consequência, freio na barbárie.
Por outro lado, a repreensão extremada ao desejo sexual, através do rigor moral excessivo, como a maioria das igrejas trabalha e introjeta como crença em seus seguidores, causa graves danos psicológicos e impulsiona neuroses.
O pastor (e seus similares nas diversas religiões – padre, apóstolo, guia) é vítima do próprio veneno. Prega em cultos, encontros que o desejo sexual ofende o Criador. Prevarica quem, na alcova ou entre um culto outro, na seca ou molhadinha, engata um esquenta virtual com a parceira antes dos finalmente.
Na Idade Média, como salientou o neurocientista Sébastian Bohler, grande parte do trabalho de um cristão consistia em lutar com sua vontade contra grandes reforçadores primários – fome, sede, abrigo, sono, toque, sexo, toda essa gama de instintos e porções que, homens e mulheres, nos impele à sobrevivência.
O desejo, pois, é meu, teu, nosso pastor… e nada nos faltará, agigantando ainda mais a fé no Senhor, se o sexo e sua dimensão imprescindível de fantasia for exercitado, por que não, com uma chamada de vídeo ou troca de mensagens eletrônicas regada a muito tesão.
(*) Jeso Carneiro é jornalista e editor-chefe do JC. Leia também dele: Presta atenção no degrau abaixo!, Adriana Almeida e um recorde a ser batido em 2026 que perdura há 46 anos, e ainda João Pingarilho, as oligarquias e colo macio do MDB.
— O JC também está no Telegram. E temos ainda canal do WhatsAPP. Siga-nos e leia notícias, veja vídeos e muito mais.
Deixe um comentário