Rússia x EUA e Europa em 5 tempos: política, território e economia. Por Válber Pires

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Rússia x EUA e Europa em 5 tempos: política, território e economia. Por Válber Pires
Ataque russo à Ucrânia na madrugada desta quinta-feira (24). Foto: Reprodução

Tentarei explicar, aqui, de modo resumido, os pontos principais para entender as relações internacionais e o jogo de poder entre Rússia e o Ocidente.

1 – Níveis de análises de relações.

Há 3 níveis de análise das relações internacionais: dos agentes, dos Estados e do Sistema Internacional (SI). No nível dos agentes, analisa-se os padrões da natureza humana e como eles se refletem nas relações entre povos, países e nações. No nível do Estado, analisa-se os interesses de cada Estado, associados ao seu Regime Político, Sistema de Governo e Grupos de Poder que o comandam. No nível do SI, analisa-se os padrões das relações entre Estados, com base na premissa de que a relação entre estes atores é anárquica, porque não existe um poder central em nível internacional, mas que, no meio desta anarquia, existe uma hierarquia de poder, decorrente da diferença de poder econômico, político e militar entre os países.

— LEIA também de Válber Pires: Movimentos sociais, mineradoras e municípios: vincular a CFEM.

2 – Teorias das relações internacionais.

Há diversas teorias de análise das relações internacionais, porém, as duas principais são a Liberal e a Realista. A teoria liberal parte do princípio de uma natureza humana benevolente, solidária e sociável. Neste sentido, as relações internacionais se explicariam pela vontade natural dos seres humanos de cooperar, se solidarizar e se relacionar entre si. Logo, os Estados e o próprio SI devem consolidar as bases institucionais (regras, normas) necessárias para favorecer e fortalecer estes anseios humanos. A teoria realista parte do princípio de uma natureza humana egoísta, traiçoeira, gananciosa e não-confiável. Deste modo, as relações internacionais se explicariam pela busca da satisfação de interesses egoístas e gananciosos, isto é, interesses econômicos, de poder, dominação e defesa de espaço ou território. Por isso, na perspectiva liberal, o principal instrumento de equilíbrio das relações entre Estados é a Diplomacia, enquanto que, na perspectiva realista, este instrumento é a Força Militar.

Cidade ucraniana sob ataque russo. Foto: Reprodução

3 – A expansão da Otan sobre o Leste Europeu.

Com o fim da União Soviética em 1991 e da Ordem Internacional Bipolar (EUA x URSS) que dominou o cenário geopolítico internacional desde 1945, a Otan (Organização militar comandada pelos EUA e potências da Europa Ocidental) passou a expandir seus domínios sobre o antigo território de influência russo no Leste Europeu. Primeiro, em 1992, sobre a Bósnia e Herzegovina. Segundo, sobre Kosovo, em 1998. Terceiro, com o ingresso de diversos países da área de influência russa nesta aliança militar a partir de 1999. A Otan diz que a Rússia não tem o que temer com sua expansão porque é apenas uma aliança militar defensiva, isto é, só ataca se for atacada. Porém, seu histórico de guerras ofensivas é extenso. Só para lembrar: Bósnia e Herzegovina, Kosovo, Iraque, Afeganistão, Síria, Líbia.

4 – O aumento das relações entre a Rússia e o Ocidente.

O fim da URSS também proporcionou o aumento da integração econômica da Rússia com os países ocidentais. Atualmente, a Rússia é responsável por cerca de 45% do gás consumido na Europa. A Europa é o segundo maior parceiro comercial da Rússia, mas, também, tem na Rússia seu quarto maior mercado consumidor. A Rússia exporta, principalmente, combustíveis para a Europa e importa, principalmente, maquinário destes países. Há, portanto, uma relação de mútua dependência econômica bastante acentuada entre Europa e Rússia. Contudo, a valorização dos preços das commodities internacionais fez com que a Rússia acumulasse mais de 600 bilhões em reservas internacionais ao longo dos últimos anos. Por sua vez, o aumento da parceria econômica entre Rússia e China também contribuiu para reduzir a dependência econômica da Rússia em relação à Europa nos últimos anos.

5. Conclusões

Para a Rússia, é evidente que a Otan não tem propósito defensivo com sua expansão sobre os países do leste europeu, mas, sim, de usar estes países para desestabilizar o regime político russo – as famosas “primaveras”-, armar os países do leste europeu para chantagear a Rússia, promover guerras híbridas – com as quais tem destruído países como o Brasil e a Líbia- e, mesmo, preparar o terreno para uma guerra militar.

Por isso, mesmo com o risco de sacrificar seus interesses econômicos com a Europa e os EUA, a Rússia está disposta a colocar um freio a estas pretensões europeias e norte-americanas.

Em outros termos, para a Rússia, a defesa do seu território e do seu regime político é mais importante do que os interesses econômicos com a Europa e EUA.

Caso as sanções dos EUA e Europa contra o urso asiático sejam muito pesadas, o fortalecimento das relações com a China e outros países da Ásia poderão compensar. Caso não compensem, o país fará reajustes internos.

Contudo, a Otan precisa entender e levar a sério o recado russo. Para lembrar o mestre da filosofia da guerra Sun-Tzu: vocês estão me encurralando e me deixando sem saída. Se continuarem com a pretensão de avançar sobre a Ucrânia não restará saída para mim a não ser a guerra. E, como lembra o mestre Tzu: ao obrigar seu inimigo a lutar pela própria vida cada soldado dele valerá por 10.

<strong>Valber Pires</strong>
Valber Pires

É doutor em Sociologia, pós-doutor em Socioeconomia da Mineração, mestre em Planejamento do Desenvolvimento Sustentável. Escreve regularmente no JC.


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