Telegráficos, a comunicação dos nossos tempos. Por Alessandra Helena Corrêa

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Telegráficos, a comunicação dos nossos tempos. Por Alessandra Helena Corrêa
Viramos telegráficos. “O nosso desenvolvimento como seres humanos e sociedade não precisa disso, certo?!”


“Posso lidar com você me dizendo o que eu fiz ou deixei de fazer. E posso lidar com suas interpretações. Mas, por favor, não misture as duas coisas.”

Na última crônica, falei com vocês sobre a comunicação telegráfica. Uma comunicação que, assim como esse instrumento obsoleto, caracteriza-se por ser lenta e cheia de “lacunas”. Mas o que seria de fato essa comunicação nos dias atuais?

Dentro da geração chamada por alguns de “Z” o desenvolvimento discursivo de ideias tornou-se cada vez mais raro – e seletivo. Nos tornamos, literalmente, uma rede de compartilhamento, o “copy” and “paste” no seu formato ainda mais escrachado.

Efetivamente uma grande cadeia de ideia (sim no singular) compartilhada, “repartilhada”, encaminhada, até torna-se um viral, trending topic – manifesto virtual. Formando vários grupos (redes), conforme a ideia que os unem.

Sabendo que a comunicação telegráfica tinha como um de seus atributos a escrita por símbolos, partilhados apenas por um “restrito” grupo, com uma espécie de código a ser decifrado, vemos, nos nossos dias, uma assimilação desse aspecto nas nossas mensagens transmitidas. A escrita e a comunicação atual são baseadas, muitas vezes, em ranhuras pela falta de contato social.

Impulsionada pela facilidade de expressá-la através das redes, a comunicação do nosso século tem criado gênios do saber, donos das verdades (sim, são muitas), e mestres da opinião.

Mas por que essa necessidade de afirmar ideias, ao invés de criar conhecimento? Por que redomas ao invés de laços que nos envolvam?

A sociedade da inclusão exclui com facilidade. A geração do conhecimento não busca o desconhecido. As pautas sociais tornaram-se hashtags em status que individualizam.

A comunicação, na sua etimologia, é exatamente o oposto disso. O ato define-se como uma ação de participação, em que dois ou mais indivíduos partilham informações que geram novos conhecimentos, por meio da interpretação e da criação que esse grupo de elementos nos permitem.

É a materialização do pensamento e dos sentimentos. Mas para materializá-la é necessário concebê-la, criá-la, gerá-la a partir dos vários componentes que essa exige.

O control+v desativa seu potencial. No mais, no ato da comunicação temos dois elementos fundamentais, segundo a teoria do linguista Roman Jakobson, para que essa ocorra: o código e o canal. Um é responsável pela forma como a mensagem será passada, e o segundo por onde.

Hoje o principal canal de comunicação de fato são as redes sociais, e o código a escrita na nossa língua materna. Dois elementos que, como já vos disse, apresentam falhas, “buracos”.

No artigo "Telegráficos, a comunicação...", Alessandra Corr~ea afirma: "
“Hoje o principal canal de comunicação de fato são as redes sociais”

Na oralidade, entretanto, tais elementos são subsidiados por vários outros: contexto, expressão facial tom de voz, olho no olho, tempo. A comunicação é mais assertiva, apesar de, sim, ser passível de falhas, incoerências ou má compreensão.

Assim, essa pode ser usada de forma funcional – quando nos une ao outro e cria relações entre os indivíduos; mas também pode ser disfuncional – quando nos afasta, e literalmente, cria uma tela entre nós, com incompreensões e desentendimentos.

O nosso desenvolvimento como seres humanos e sociedade não precisa disso, certo?! Precisamos ser menos resistentes às ideias do outro. Saber ouvir, mesmo que não concordando. Saber filtrar aquilo que lemos, ouvimos, comunicamos; somar conhecimentos.

Até podemos dizer que a disparidade entre a nossa milenar existência, e ainda arcaica evolução se dá em grande medida à essa comunicação telegráfica…

<strong>Alessandra Helena Corrêa</strong>
Alessandra Helena Corrêa

Santarena, é graduada em licenciatura plena em Letras (Ufopa). Faz mestrado atualmente em Estudos Literários, Culturais e Interartes na Universidade do Porto, Portugal, onde reside. No Instagram: @alehhelena

Leia também de Alessandra Corrêa: Um passado futuro: narrativa sobre o tempo.

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