Assim que a noite surge em Alenquer, a praça João Tito Alves de Souza, na frente da cidade, começa a ter um grande movimento de pessoas. Pessoas organizando suas vendas para trabalhar e também pessoas que, entre parentes e amigos, juntam-se em algum lugar do logradouro para viver o ambiente e o momento.
Mas entre todos esses seres, uma figura bastante conhecida se junta à multidão. Um personagem simples, mas que tem uma grande história e que tem respeito de praticamente toda a cidade.
Sebastião Nogueira da Costa é o nome de batismo do popular Sabá ou Seu Sabá, o pipoqueiro mais icônico em atividade no município de Alenquer. Seu Sabá nasceu na comunidade alenquerense Urucurituba, em 21 de janeiro de 1950. Essa comunidade da várzea é berço de memoráveis personagens da história e da cultura chimanga.
Sabá é filho de Manoel Silva da Costa, que foi pescador e agricultor, e de dona Aurélia Nogueira da Costa, também agricultora e que, como o filho lembra, plantava tomate, melancia, feijão, entre outros tipos de alimentos.
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É o quinto de um total de 13 filhos. Como ele diz, Seu Manoel e dona Aurélia tinha, cada um, sua própria plantação e faziam a sua própria colheita. No fim das contas, juntavam o que tinham de alimentos e todos da família comiam juntos.
O pequeno Sebastião viveu e aprendeu todas as atividades que um morador de comunidade de várzea costuma fazer. Aprendeu a pescar e a plantar com seus pais e irmãos. Fez da vida simples a essência do ser humano que é. Aprendeu o valor do cuidado pela família e da importância do trabalho, independentemente de como ele seja, para viver o suficiente no seu lar. Mas ele nunca estudou regularmente.
Como o pai tinha hérnia, Sabá ajudou na criação dos irmãos mais novos, além de, desde a infância, trabalhar pescando e plantando ainda na comunidade Urucurituba. Pescava utilizando arpão, arco e flecha, que eram os instrumentos que ele mais gostava de utilizar. Plantava juta, mandioca, feijão e vários outros tipos de alimentos.
Quando pescava, vendia para alguns marreteiros, entre eles Chico Chindongo. Viveu praticamente toda a sua juventude na comunidade Urucurituba e foi a Alenquer morar somente depois da metade da década de 1970, tendo o bairro Luanda como sua moradia na cidade.
Como gostava de festas dançantes, o jovem pescador frequentava a sede social do Esporte Clube Internacional, onde ouviu ritmos daquela década ao som de grupos musicais inesquecíveis da história de Alenquer, como o grupo “Os Adoráveis”.
Foi numa dessas noites de dança que ele conheceu a jovem Maria Francisca Sena da Costa. Na verdade, foram necessárias várias noites de dança no Esporte Clube Internacional para que eles pudessem, enfim, fortalecer os sentimentos que tinham um pelo outro.
Ambos se casaram no ano de 1978, quando ele tinha 28 anos e ela, “18 ou 19 anos”, na “capelinha da Paróquia”, onde hoje é a conhecida “Casa dos Padres” de Alenquer.
Depois de casados, foram morar às proximidades da comunidade Palhal, onde Sabá trabalhava como vigia da firma Gleba Curuá. Além disso, nas horas em que não estava em serviço da firma, realizava as suas atividades de agricultor, plantando milho, feijão e arroz.
Ainda na comunidade Palhal, o casal teve 8 filhos, dos quais um morreu recém-nascido e os outros 7 nasceram e viveram de forma sadia: Francenilson, o “Nilson”, Francivaldo, o “Dinho”, Erivaldo, Sebastião, Elcione, Elinelson e Anacleto. Devido a desentendimentos que teve na firma onde era funcionário, decidiu morar de forma definitiva na zona urbana de Alenquer.
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Na cidade, Sabá continuou as atividades de pescador. Porém, precisou aprender outras funções para se adequar à nova realidade em que estava vivendo. Muitas atividades o jovem Sabá costumava aprender sozinho, geralmente apenas observando como os profissionais faziam os seus serviços.
Durante um tempo foi cabeleireiro, uma habilidade que ele aprendeu só observando como os cabeleireiros da época faziam os cortes nos seus clientes. Também foi carpinteiro, uma profissão em que quase todas as habilidades foram aprendidas por conta própria, porém, confessa que teve algumas instruções de um velho carpinteiro de sua juventude, conhecido como Pirapitinga.
E assim, Seu Sabá foi trabalhando e sustentando a família ao lado de sua esposa, a dona Maria Francisca, que passou a ser conhecida popularmente como “Dona França”. Os sete filhos que tinham e que a eles, apesar dos desafios, era dado todo ensinamento necessário para que fossem futuros trabalhadores e bons seres humanos.
Existia em Alenquer um pipoqueiro chamado Chico Déo, que empurrava seu carrinho de madeira pela cidade, vendendo pipocas por onde passava. Ao conhecer o segundo filho de Sabá, o pequeno Dinho, chamou-o para ser seu funcionário. O rapazinho tinha entre 8 e 10 anos, quando foi chamado para vender pipoca nas ruas de Alenquer. Um rapaz que muito sonhava em ser motorista.
Aquilo foi uma grande oportunidade para ajudar na renda familiar. Além de pipoca, Dinho também vendia geladinho e cheiro-verde. O tempo foi se passando e o pipoqueiro Chico Déo ficou impossibilitado de continuar a trabalhar e, assim, de ser patrão do rapazinho, que fazia muito bem os seus serviços pela cidade.
Com isso, Sabá comprou o carrinho de pipoca de Chico Déo, decidindo se tornar o mais novo pipoqueiro de Alenquer. Isso foi entre o fim da década de 1980 e o início da década de 1990. O novo empreendimento tornou-se um ótimo negócio.
De casa para praça
Posto de trabalho: nunca abandonou
Essa atividade foi mais uma, entre as muitas que ele teve, que ajudou no sustento de sua família. Vendia pipoca pelas ruas sempre na companhia de um ou mais filhos.
Tentou vender nas frentes de casas de festas, como a Danceteria Pica Pau ou a Danceteria Ilha Verde, mas viu que esses lugares não tinham bom rendimento para venda. Pensou em ficar vendendo em praça pública, como a de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no bairro Planalto, mas viu que lá também não era muito bom. Sabá passou a fixar seu espaço na praça Tancredo Neves, na orla da cidade, onde sempre foi comum as pessoas irem passear nos fins de tarde.
Com o passar do tempo, a praça mudou de aspecto e de nome, passando a se chamar João Tito Alves de Souza, mas nunca deixou de ser seu posto de trabalho. Quem caminhava pelo logradouro sempre via a figura de Seu Sabá com seu carrinho de pipoca, um senhor vestido com uma roupa simples e usando seu chapéu, objeto que se tornou uma de suas marcas ao longo de mais de 30 anos vendendo pipoca.
Todos os dias era a mesma ação e o mesmo trajeto: preparando as pipocas em sua casa para, assim, vendê-las durante a sua caminhada. Saindo de sua casa, num beco do bairro São Cristóvão, empurra o carrinho na maior parte da Travessa Capitão Eugênio Marques, entre o bairro de sua casa e Luanda, pegando a Rua Dr. Pedro Vicente, em trecho que compreende os bairros Luanda e Centro, descendo a travessa Santo Antônio, atravessando a praça Santo Antônio, seguindo pela rua Coaracy Nunes, descendo um quarteirão da travessa Arnaldo Moraes, seguindo dois quarteirões da avenida Benedicto Monteiro, até chegar ao seu destino: praça João Tito Alves de Souza.
Seus filhos tiveram diferentes funções. Francenilson tornou-se contabilista; Francivaldo, motorista de carreta; Erivaldo, trabalhador autônomo; Sebastião, agricultor; Elcione, dona de casa; Elinelson; motorista de aplicativo e Anacleto; pedreiro.
Talvez o mais triste acontecimento na sua família foi uma tragédia que aconteceu no fim da tarde do dia 13 de fevereiro de 2022, quando o primogênito Francenilson, enquanto pescava no lago Curumu, naufragou com sua canoa e se morreu, apesar de ter sido um exímio nadador. Uma fatalidade que comoveu Alenquer.
Atualmente Seu Sabá já está aposentado. Mesmo assim, por amor à profissão, continua a vender suas pipocas na praça, com menos frequência de antes, sempre fazendo o mesmo percurso e sendo cumprimentado pelas pessoas, que o veem há muito tempo nessa atividade, sem perder a humildade e alcançando mais respeito pelos alenquerenses.
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