O ponto mais alto da subida é o início da queda. Por Paulo Cidmil

Publicado em por em Opinião, Política, Santarém

O ponto mais alto da subida é o início da queda. Por Paulo Cidmil
Praça Rodrigues dos Santos, na área central de Santarém: demolição da história. Foto: Paulo Cidmil

A acirrada discussão sobre o destino da Praça Rodrigues dos Santos, local histórico em Santarém (PA), se deveria ou não ser transformada em um camelódromo, emergiu após a abusiva ação do poder público de destruir a passarela de pedestres, demolindo árvores, com o objetivo de implantar um bisonho camelódromo de puxadinhos, com 100 biombos de 2m x 4m.

Findou por mobilizar pessoas e instituições como o Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós (IHGTap), tendo à frente a historiadora e professora Teresinha Amorim e o engenheiro e professor Jackson Rego. Formalizaram denúncia ao Ministério Público do Pará, que, na Justiça, conseguiu a paralisação da obra e o devaneio do poder público, que demonstrou desconhecer ou não respeitar a nossa história.

A mobilização e o debate sobre a ação do Município, que pretendia transformar parte de um bem coletivo em propriedade privada de alguns, ultrapassou nossas fronteiras. Foi acompanhado de perto pela Secretária Estadual de Cultura do Estado vizinho, Úrsula Vidal. Suscitou discussão sobre Patrimônio Histórico e Cultural em outros municípios da região do Tapajós e despertou o interesse de um jovem formando em arquitetura na USP (Universidade de São Paulo).

Felipe Nunes é um arquiteto com forte interesse na área de humanas, especialmente história, arqueologia e antropologia. A Praça Rodrigues dos Santos caiu como objeto perfeito para um projeto de fim de curso de graduação em arquitetura. O interesse pela Amazônia trouxe Felipe a Santarém no exato momento em que se discutia a história e o destino da praça.

Felipe bateu à porta da Ufopa e de outras instituições e pessoas. No dia 8 de dezembro recente, apresentou projeto de revitalização da praça em uma roda de conversa sobre Arte, Bioeconomia e Ocupação de Espaços Amazônicos, evento realizado no Ministério Publico e coordenado pelo projeto Luz e Ação na Amazônia, com a presença de professores e estudantes da Ufopa, artistas e produtores culturais.

Hoje, a mobilização em torno da revitalização e ressignificação da Praça Rodrigues dos Santos, como espaço de história, cultura, gastronomia e lazer se amplia.

Há amplas parcelas da sociedade atentas para o destino que o poder público pretende dar a esse espaço, que se tornou estacionamento e há várias gestões está abandonado, sem iluminação adequada, manutenção, segurança e iniciativas culturais.

Dar publicidade ao projeto elaborado por Felipe Nunes é importante para que a sociedade vislumbre outras possibilidades de uso desse local histórico. Sua iniciativa é o ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre como pretendemos nos conectar a nossa história e ao mundo contemporâneo.

Como podemos vivenciar melhores práticas de civilidade e bem-estar social, em que seja possível a convivência na diversidade senão nos espaços públicos?  E qual logradouro público promove maior inclusão do que uma praça?

A visão obtusa sobre economia e geração de emprego e renda, além de uma ideia inconfessável de higienização do espaço entre os Correios e a Praça da Matriz, levou a atual administração a promover um crime contra o patrimônio histórico, além de crime ambiental.

O tiro mal calculado acertou o pé dos donos da ideia. Dezenas de pessoas se manifestaram. Desde então o Ministério Público tem atuado com muita firmeza, sem titubear ou aceitar propostas de mitigação.

Mas a história não parou na ação do IHGTap. Docentes da arqueologia da Ufopa apresentaram estudos demonstrando a importância da praça como local de memória. O Instituto Sebastião Tapajós vem sugerindo a criação de um corredor cultural que contemple a praça.

O deputado federal Airton Faleiro, político que tem dado enorme apoio a manifestações e iniciativas culturais de Santarém e região, acompanha toda a polêmica e já manifestou seu apoio para um projeto de refundação da praça.  

Profissionais da arquitetura e urbanismo acompanham a discussão e demonstram disposição em participar de projeto que vise à revitalização do espaço. Aqui cito dois arquitetos que atuam no mercado, ambos receberam de forma positiva o projeto de Felipe Nunes.

Anísio Quincó, arquiteto premiado, com boa experiência na elaboração de projetos e execução de obras de intervenção e revitalização urbana, estudou em uma das principais escolas de arquitetura e urbanismo das Américas, a FAU de Buenos Aires (Argentina), onde foi aluno da cátedra Projeto Urbano, de Berardo Dujvone, referencia mundial em urbanismo, um dos responsáveis  pela revitalização de Puerto Madero, na capital argentina. Participou da equipe coordenada por Berardo, que projetou a mudança de centralidade da cidade de Tigres, na Grande Buenos Aires.

Anísio vê o projeto acadêmico de Felipe como um ponto de partida para motivar ampla discussão sobre o que ele chama de refundação do marco zero da cidade, onde a principal referência é a sua importância histórica. Sugere que o espaço esteja conectado ao centro histórico, que seja inclusivo, contemple as demandas do comércio no entorno, como criar alternativa para estacionamento e a valorização do Mercado Municipal.

João Cabral, outro arquiteto, mergulha no interior da praça através do projeto de Felipe, se entusiasma com a ideia de um anfiteatro e memorial histórico, gosta da ideia de um espelho d’água, sugere espaços de convivência, da infância à terceira idade e questiona qual o projeto de arborização e paisagismo adequados.

Ambos acham importante a consultoria de Renato Sussuarana, autor do projeto original, onde um dia existiu até chafariz.

Enquanto a sociedade se articula em torna da defesa de nossa patrimônio histórico e da manutenção de um espaço que merece investimentos e deveria ser de lazer e memória, o governo Nélio Aguiar permanece insistindo na implantação de um camelódromo, antes dentro da praça, depois no seu entorno, ocupando uma das ruas laterais.

Nélio tem governado para o empresariado e os donos do dinheiro, negligenciando o bem estar social da população, todos os espaços de lazer estão depreciados e abandonados.

O que ele propaga como grandes obras de seu governo: hospital, porto, orla, ginásio poliesportivo, centro de convenções, asfalto na área urbana, tem a marca, os recursos e a assinatura  de Helder Barbalho. Que lhe deu a reeleição de presente e sabe o que ele fez na última eleição.

O sonho de inaugurar sua dinastia política morreu na praia, levando junto os anseios de aliados e possíveis aliados. Nem sua Celsa nem outras candidaturas da cidade com potencial para conseguirem um mandato se elegeram. Nélio se imaginou uma águia e deu um voo de coroca.

Seu tutor, o ser onipresente da política local, durante os seis anos do governo Nélio, teve suas demandas atendidas e agasalhou os seus apadrinhados, agora acaba de eleger para o Congresso Federal seu pupilo predileto.

Nas próximas eleições municipais, Nélio lhe será de pouca serventia, pode ser descartado, a não ser que esqueça seus sonhos de águia e volte a ser um bom pangaré na tropa de Lira Maia. Nélio estará solitário, assim como seu mito Bolsonaro.

Tem para apresentar ao eleitor uma seleção de obras oportunistas e de mau gosto. E alguns secretários onde a má gestão é a regra: a passarela sobre a praia do Maracanã; um camelódromo na Praça Rodrigues dos Santos; uma orla de concreto na praia de Ponta de Pedras; a pavimentação da estrada Interpraias, uma uva para a pressão especulativa sobre a terra. Urgente seria a regularização fundiária, sem a qual há a depreciação no valor das terras dos comunitários.

Transito caótico com excesso de acidentes e mortes, ruas e estradas sem manutenção e sinalização. Hospital municipal alvo de denúncias diárias e todo o sistema de saúde municipal sucateado e mal assistido.

Zero de política ambiental de pífia fiscalização.

Zero de política cultural, em que há um assistente de palco, dublê de gerente de vendas: “não temos dinheiro para apoiar seu projeto, posso te dar som e iluminação”. Fora isso, costuma tumultuar com sua arrogância e sapiência os comunitários de Alter do Chão na realização do Çairé.

A má gestão pode ser explicada por falta de recursos, mas também por péssimas escolhas. As obras “geniais” de passarela sobre praia, camelódromo em uma referência histórica, orla em ponta de pedras e interpraias para satisfazer os gulosos, se foi ideia de algum assessor. Nélio Aguiar não precisa de inimigo, já tem um de estimação em sua assessoria.

Ele sai da recente eleição bem menor do que entrou, precisa se reinventar, dialogar com a sociedade, que não se resume ao empresariado, tem a seu favor um ano e meio de mandato, sua honestidade e uma pista de skate.

PS1.: Onde estão os nove anéis viários que o senhor prometeu? Não vejo um. Não creio que Helder lhe dará de natal.

PS2.: Depois da atrapalhada e mal explicada licitação para o transporte público, quando chegam os ônibus da China?

PS3.: Não consigo lhe esquecer, lembro sempre das mangas, fartas nas mangueiras da Praça Rodrigues dos Santos, que o senhor mandou destruir.

Que em 2023 se concretize a esperança,  desperta com a eleição de Lula

Um próspero ano novo a todos os leitores do JC.

<strong>Paulo Cidmil</strong>
Paulo Cidmil

É artista e produtor cultural. Reside em Santarém. Escreve regularmente no JC.

  • JC também está no Telegram. Siga-nos e leia notícias, veja vídeos e muito mais.


Publicado por:

5 Responses to O ponto mais alto da subida é o início da queda. Por Paulo Cidmil

  • Querido Paulo Cidmil, falou tudo!
    A Bostanaria empresarial que domina o Município com seus projetos horrorosos e especulativos precisará ser derrotada. com uma enxurrada de belos projetos como esse da revitalização e alternativas politicas que levem em conta a inteligência e o bom senso da nossa população urbana e interiorana!
    Parabéns pelo artigo

  • PAULO CIDMILBESTEIRAS RIDES AGAIN ! pUERTO MADERO É UMA BOSTA DE LOGRADORO TURISTICO…ESTÁ HA ANOS LUZ DA MAJESTOSA ESTACÁO DAS DOCAS… EU EIN ?

  • Extremamente delicado, oportuno e preciso em palavras medidas do começo ao fim, Paulo Cidmil demonstra com seus artigos ser, um cidadão da mais alta importância para Santarém e Região. Com muita responsabilidade, soube ouvir e dar bom trato as diferentes visões sobre este triste e lastimável fato que aconteceu a quase 01 ano e até agora a prefeitura não consegue resolver, obedecendo o que pede a própria lei ou seja: fazer o licenciamento ambiental para a praça, ter a anuência do IPHAn e também a oitiva dos interessados. Como Santereno e tendo como ancestralidade os Tapajós, povo dito extinto, mas que está presente em cada um e cada uma que conhece sua história, oferecemos a nossa resistência a todas as mazelas com as obras de mal gosto que não respeitam a nossa identidade, nossa cultura e a tradição dos povos originários do Brasil. Isto foi assim até ontem quando o desgoverno do abre as porteiras atuou forte. Agora temos um novo governo e com ele Sonia Guanabara, Marina Silva, Silvio Amorim, Margareth Menezes e o próprio povo, tão bem representado pelo Lula e pelos que lhe passaram a faixa. Desde sempre e o prefeito Nélio sabe, nos colocamos a disposição para o dialogo, o que seus assessores não souberam conduzir. Com Maria Deputada Estadual, Ayton Faleiro Federal, Ministério das Cidades nas mãos dos Barbalhos, é possível sim Transfomamos a Praça num lugar de Bioeconomia, de Socialização que represente os anseios ambientais nossos e do mundo e, voltemos a ter no lugar de Moaçara e Nurandaluguaburabara, a paz, a harmonia e equilíbrio para que se possa conviver com tranquilidade, os ambulantes e toda população. Estes são as sementes e frutos de nossa ação. Viva a democracia, a resistência e a cultura. Que pensemos em União e Reconstrução de pelo menos nossa Ocara-Açu, com toda a modernidade que se pode ter neste lugar que é o coração de Santarém, da Amazônia e América Latina.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *