
Pouco a pouco era uma Recife que precisava ser explorada. Três primos moravam em um apartamento de vanguarda, Boa Viagem, quarto andar, mais na frente no tempo, engolido por edifícios maiores.
Que festa a minha chegada! Já sabíamos que o plano era aproveitar, e a maior e esperada responsabilidade era na minha pessoa, bebedor de vodca.
Limão com Mel, trilha sonora topada até o “talo” no apartamento, fotos turísticas para cá e para ali, Caruaru estava sendo desenhada no nosso roteiro como forte objetivo de viver a festa junina mais raiz do nordeste, do Brasil.
— Leia também de Jorge Guto: Caruaru e quatro primos (parte I).
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A postos, a mais velha dos primos, da trupe na faixa de idade depois da minha, era universitária e dominava as primeiras maravilhas que a Internet poderia entregar de facilidades, como reservar hospedagem pertinho da feira da Sulanca, mesmo estando longe. Era uma rua sem saída bem próxima da ponte.
No ônibus rumo à cidade de Caruaru, três primos e eu. Dois homens e duas mulheres. Foi chegando e a gente total sóbrio da condição de primos em férias. Tínhamos bordões, códigos, mais jargões, havia levado um vocabulário bem “cabôco” pra eles matarem saudades – “me respeita que quem nasce pra ser cuia nunca chega a ser copo de cristal ” – “dez anos de parede, vou já perder pra osga “.
Comíamos bastante durante o dia, bebíamos, alcoólicos e não alcoólicos, eu mais que todos! Na roda gigante pra ver a cidade de cima, o refrigerante foi trocado de mãos, e meu álcool foi parar na boca da prima que era dos refrigerantes.
Ela ria freneticamente num uhuuuul e eu decepcionado com a bebida doce e sem efeito. Pois bem que a noite dançávamos forró ao som de pifes, e ao voltar para o hotel agendado remotamente, já quase pela manhã, aquele bairro da Sulanca, deserto, uma viela e um povo mais esquisito que a gente no saguão de um hotel de quinta.
Depois de uma festa no auto do Moura, vindo nos deixar, um taxista nem quis receber um valor que precisava de trocado, danou-se a agradecer e olhava para os lados. Seguíamos sempre dançando pelas ruas vazias, felizes e mais embriagados de juventude.
Que dias incríveis. De tudo um pouco, aproveitamos! Compras na Sulanca, pipoca de gente atrás de trios, tome xote, forró, zabumba de pertinho, sanfona com os olhos do sanfoneiro aprovando a nossa alegria. Uma banda qualquer se alimenta dessa energia, mas em Caruaru isso era reluzente. Que bonito.
E nos arrumamos certo dia, diárias quitadas, o rumo era a volta pra Recife de Boa Viagem. O saldo eram as lembranças que vivem no coração desses quatro primos. Ainda partimos depois de ônibus, Recife para Belém. De barco, Belém a Santarém.
No barco, novas amizades, que seriam em sua maioria esquecidas. Há esse fenômeno: melhores amigos de bordo por aqui na amazônia, é sinal que jamais serão reencontrados, apesar de tão pouco esquecidos. A não ser que um tenha a torpeza de se aproveitar das bagagens e cometer furtos, como ocorrera de ser o mais simpático também o mais ladrão, que só depois do embarque, se percebia.
Ora, e por falar de crimes, que surpresa foi descobrir depois que tínhamos nos hospedado no local mais perigoso do nordeste! Hoje em dia teria virado vlog, meme. Virou crônica mesmo.
Estávamos protegidos pela alegria de um momento único, a sorte que tem os bem humorados, sem sérios boletos para pagar, a áurea protetora de quem estava logo optando pela felicidade, afinal, vai se saber o que o futuro nos reservaria. A felicidade tem muita pressa. Primos, irmãos, conectados até os dias atuais apesar da vida que cada um leva.
Ter primos, cultivar o amor, a cumplicidade, é por exemplo o que faz valer a pena. Viajar, orçamento apertado, abastada mesmo quem precisa ser é a alma.

➽➽ Jorge Augusto Morais, o Jorge Guto, é santareno, formado em direito e aprendiz da crônica reflexiva, em prosa, influenciado por uma tia, professora de literatura brasileira. Desde criança lê contos e escreve sobre dramas humanos universais, tendo como cenário uma Amazônia que pode estar na informalidade e no inusitado.
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